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Coisas que pingam

Em um ou dois textos anteriores mencionei que ia escrever sobre construção, uma vez que a experiência de construir casa tem comido com farofa minha reserva cognitiva nos últimos três anos.

Ainda não decidi por onde começar, mas tem um tópico com que estou brigando nos últimos dias: hidráulica, em particular conexões rosqueáveis. Até meu encanador tomou um ou dois olés — você nunca espera que um registro instalado por encanador vá vazar, mas acontece. Detesto mexer com hidráulica, mas até por detestar, a gente procura opções melhores do que o pão-com-manteiga, para fazer direito uma vez e poder esquecer que o troço existe.

Assim, acho que tenho algumas informações que pode interessar aos pobres maridos mundo afora, a quem sempre cabe consertar as coisas que pingam e as coisas que soltam faíscas.

Fita veda-rosca é coisa do capeta

Em tese, basta ler a embalagem: 5 a 8 voltas de fita teflon, enrolada no sentido horário com a rosca voltada para você, e pronto. Com pouca fita teflon, a peça rosqueia super fácil. Uma vez que canos de água têm rosca cônica, em tese eles vedam por si mesmos; a utilidade do teflon seria basicamente lubrificar a rosca.

Essas instruções NUNCA funcionaram para mim. Nunca!!!

Mas, como eu sou um trouxa, a cada tantos anos tento novamente obedecer as instruções, por medo de colocar fita em excesso e estourar alguma conexão. O resultado é sempre um vazamento, em geral daquele que demora 1h para formar uma gota, o que o torna ainda mais inconveniente.

Figura 1: O pesadelo do sistema: uma gota que mina por baixo da fita teflon. A rosca desse registro é muito afiada e corta o teflon. Não ajuda o fato da rosca macho não ter penetrado um número suficiente de voltas, provavelmente por culpa do excesso de teflon.

TL;DR achei algo infinitamente melhor: fio veda-rosca Loctite 55. Lembra muito um fio dental. É até difícil de acreditar que funciona, mas funciona. É insuperável quando há rosca de metal envolvida, como em torneira de metal, registro de metal, etc.

Outra vantagem do Loctite 55 é permitir ajustes de até 1/4 ou 1/3 de volta, o que é muito conveniente ao instalar torneiras e chuveiros. A fita teflon pode deixar de vedar ao menor movimento anti-horário. O rosquear é mais pesado com fio do que com fita, mas nada que faça medo.

Outra coisa curiosa é que não é necessário colocar o fio exatamente dentro da rosca, embora certamente fique mais bonito. O importante é a) respeitar o número recomendado de voltas para cada bitola, para não "embuchar" demais a rosca; e b) concentrar as voltas na parte da rosca que vai trabalhar, principalmente se macho ou fêmea for meio curto(a), com apenas 5 ou 6 voltas úteis.

Faça um favor a si mesmo e compre um carretel de Loctite 55, que vai durar a vida inteira. E, para aquelas situações em que a fita de teflon ainda é necessária, adquira uma fita teflon amarela "para gás".

Figura 2: Mesmo registro de gaveta da foto anterior, agora vedado com sucesso pelo Loctite 55, mais uma penetração suficiente da rosca.

Em conexões onde as duas partes são de plástico, ainda é melhor usar fita teflon. O Loctite 55 até funciona, mas exige muito aperto para vedar, e depois a peça pode ficar difícil de soltar pois o fio veda-rosca não lubrifica a rosca como o teflon. Consta inclusive no manual de alguns produtos de plástico, como chuveiros elétricos, que não se deve usar nada diferente de teflon.

Outra situação em que o fio veda-rosca não funciona sozinho é quando há uma grande folga entre conexões. O teflon é útil neste caso pois basta aplicar o suficiente para "embuchar" a rosca. Pode-se usar inclusive uma combinação de Loctite 55 e teflon por cima. Alguns encanadores sempre usam os dois quando se trata de gás (GLP, ar comprimido) para garantir máxima vedação.

Quando somos obrigados a usar apenas teflon, saiba que a quantidade necessária de fita é sempre maior do que aquelas 5 a 8 voltas do manual. Meu pai tinha uma regra: colocar teflon até a rosca praticamente sumir, o que dava 20 ou 25 voltas. Isto é um pouco demais; em geral umas 15-16 resolvem.

O Loctite 55 não pode ser usado quando o passo de rosca é mais fino que o NPT de 1/2". É comum encontrar conexões de 1/8" a 3/8", com passo de rosca bem fininho, em reguladores de gás. O teflon conforma-se a qualquer rosca, ainda que no caso específico de conexões em metal para gás, um vedante líquido anaeróbico seria o produto ideal.

A conexão mais chata

Por algumas experiências pessoais, acredito que a conexão de parede mais chata de fazer vedar é a de PVC azul para água fria, com bucha de latão.

Figura 3: Conexão de água fria mais comum nas paredes das nossas casas: rosca parte em latão, parte em plástico. Ela tem grande tendência de vazar.

A peça equivalente em CPVC para água quente tem rosca 100% metálica, talvez pelo fato do CPVC ser mais quebradiço. Contra-intuitivamente, ela tem menos tendência de vazar que a conexão azul, e aceita bem o Loctite 55.

Quando se monta uma peça metálica (como uma torneira) na conexão azul, o fio Loctite costuma funcionar de primeira. Se a peça tiver muita folga, pode ser necessário "embuchar" com fita teflon adicional para garantir uma vedação 100%.

Agora, ao montar peça de plástico, a vedação com fio Loctite é problemática, pois exige muito aperto para funcionar. É preferível usar apenas fita teflon para facilitar a retirada posterior.

O problema piora se a rosca-macho é BSP (rosca reta), que infelizmente é o caso de algumas conexões de metal que você encontra à venda. O ideal é trocar por uma peça NPT, mas se isso não for possível, o truque é embuchar com teflon formando um cone, o que forma uma espécie de gaxeta no final da rosca, e simula o aperto proporcional da rosca cônica NPT. A chance de não vedar de primeira é grande; prepare-se para diversas tentativas.

O segredo da conexão azul é que a peça-macho deve rosquear fundo o suficiente, com aperto bem justo. Se entrar frouxo até o fim de curso, vaza. Se encher de teflon e arrochar quase até o ponto de ruptura, mas entrou apenas 3 fios de rosca, vaza. O vedante tem de ser na quantidade certa para atingir o equilíbrio, o que envolve alguma tentativa-e-erro.

Figura 4: Bujão vedado com sucesso após 3 tentativas, mediante emprego de Loctite 55 e rosqueada com profundidade suficiente. Infelizmente o torque necessário para fazer vedar dificultou a remoção da peça em momento posterior.

Ainda não descobri o motivo dessa conexão em particular ser tão problemática. Acredito que seja devido à rosca composta de dois materiais diferentes.

Quando fizer algum trabalho que envolva essa peça azul, nunca confie 100%. Se você instalar 3 ou 4 conexões, é certo que uma vai vazar. Deixe aberto para inspeção por um par de dias, pois o vazamento típico é insidioso, demora horas para formar uma gota. (Tal vazamento não vai inundar seu banheiro, nem seria suficiente para danificar a alvenaria, mas poderia estragar um móvel em MDF.)

Se a peça macho é de plástico, considere usar peças novas, se possível do mesmo fabricante da peça fêmea azul. Depois de uns 2 ou 3 apertos, a rosca-macho tende a ficar estragada, ficando ainda mais suscetível a vazar. O sintoma é uma certa dificuldade de rosquear, com uma tendência de entrar cruzado.

Um último problema é de instalação: não raro pedreiros e encanadores tendem a deixar essa conexão muito enterrada na parede, principalmente quando há revestimento cerâmico. Isso dificulta o aperto de niples e bujões. Considere instalar um prolongador, ou um flexível curto.

Tipos de fita teflon

As fitas teflon variam em espessura e densidade. Só entre as fitas brancas à venda, a espessura varia entre 0.07mm a 0.1mm (40% de variação), e a densidade varia entre 0.3g/mL e 0.5g/mL (60% de variação). Então, qualquer regra do tipo "x voltas" é automaticamente furada.

Porém, a minha impressão é que as fitas atuais são mais finas e elásticas do que antigamente. Lembram quase uma teia de aranha, de tão diáfanas. Roscas metálicas cortam-na facilmente. Ao desmontar a conexão, não fica nada sobrando na rosca, então obviamente não estava vedando.

As fitas de teflon antigas lembravam vagamente um esparadrapo, sendo mais consistentes e pouco elásticas. Junto com uma bomba de água fabricada na China, veio um pequeno carretel de fita com essas características. Coincidência ou não, as conexões feitas com ela vedaram de primeira.

A fita branca padrão tem densidade de 0.3g/mL, mas existem fitas mais densas, com destaque para a Tupy, com 0.5g/mL, equivalente à fita amarela. A fita amarela é oferecida como "fita para gás", com densidade padrão de 0.5g/mL. Exceto pela cor, é o mesmo material da fita branca. 8 voltas dessa fita equivalem a 15 ou 20 da outra, apesar da espessura ser aproximadamente a mesma! Aí sim a regra das "5 a 8 voltas" tem alguma chance de funcionar.

Mais difícil de encontrar é a fita rosa, usada pelos gringos. Novamente, trata-se do mesmo material que as outras, de mesma espessura também, com densidade (0.4g/mL) intermediária entre a branca e a amarela.

Nos EUA, a fita branca só é aprovada para conexões até 3/8". Conexões entre 1/2" e 2" devem usar a fita rosa ou amarela (e lá a prefeitura fiscaliza esse tipo de detalhe). Nossa conexão mais comum é de 1/2", mas usamos fita branca, cuja densidade é muito baixa para essa bitola. Isso bate com minha impressão geral de insuficiência da fita teflon.

Se não quiser ficar lendo ficha técnica de fabricante (e nem todos publicam), e quiser ter uma boa fita teflon na caixa de ferramentas, compre a fita amarela. Ela não é imune a roscas metálicas particularmente afiadas, o Loctite 55 ainda é a "primeira resposta" para roscas em metal. Mas para aquelas situações onde só a fita teflon resolve, a fita amarela resolve melhor.

Uma última vantagem da fita amarela é que o corante concentra-se nos pontos da rosca onde o teflon "grudou", o que ajuda a diagnosticar o que está acontecendo numa rosca problemática.

Pressão de água ou gás

Uma coisa chata de conexões roscáveis é que elas podem funcionar a determinada pressão, e vazar em outra. A maioria dos encanadores está acostumado a fazer instalações com pressão típica de rua (10 m.c.a.) e gás de cozinha para fogão (0,28 m.c.a).

Quando a instalação adota uma bomba pressurizadora (25-45 m.c.a.) ou a canalização de gás alimenta um aquecedor (10-20 m.c.a. até o regulador secundário) começam a aparecer os vazamentos.

Todo circuito hidráulico tem de ser obviamente testado na pressão de trabalho. Mas a chance de vazar com fita teflon é maior que com o fio veda-rosca. Com a fita teflon, fica sempre aquela escolha de Sofia entre colocar fita demais e arrochar, ou fita de menos e vazar. Já com o Loctite 55, você usa o número de voltas recomendado, que se traduz num torque de aperto previsível, e a vedação acontece sob qualquer pressão (até o limite do produto que é 200 m.c.a.).

Outros tipos de vedação

Há alguns vedantes no estado líquido ou pastoso. Parecem ser muito mais populares no exterior do que aqui. Há inclusive uma linha de pensamento (não é unânime, mas há) de nunca aplicar fita teflon em PVC pois ela "engorda" a rosca e aumenta as chances de quebra por excesso de aperto.

De fato um vedante líquido tem potencial pois amolda-se a qualquer espaço vazio. Porém, nunca usei, e não acredito que vá usar tão cedo, pois

a) todos exigem conexões secas, e alguns têm um longo tempo de cura. Nós amadores vamos sempre mexer em instalações já cheias de água, e queremos usar imediatamente;

b) são produtos com prazo de validade curto. Um amador usaria 5% da embalagem, ou pior, usaria vencido;

c) sua capacidade de preenchimento de folgas é muito limitada. Pode-se conjugar com fita teflon para tirar a folga, mas o ponto era justamente não ter de usar mais fita teflon.

d) produtos realmente bons para conexões metal-metal, como o Loctite 577, são caríssimos.

Misturando vedantes

Não gosto muito da ideia de misturar vedantes, porém muitos encanadores de Internet recomendam algumas combinações, e juram que funciona, então estou passando adiante a informação.

Um encanador recomenda passar umas poucas voltas de teflon sobre o Loctite 55 em conexões de ar comprimido. Coincidência ou não, fui obrigado a fazer o mesmo com uma conexão de gás, por ser rosca reta que tem muita folga, e foi o que resolveu.

Outra combinação comum na gringa é pasta de vedação sobre fita teflon. Eles têm uma ampla variedade de pastas à disposição, mas um ou dois brasileiros fazem o mesmo com a Tekbond 204.

Pelo menos dois encanadores brazucas que eu vi têm vídeos recomendando passar cola de CPVC sobre a fita teflon. Não vejo como isso pode funcionar, pois "cola de PVC" não é cola, e sim solvente com um pouco de PVC dissolvido dentro.

O pior é besuntar a fita com adesivo para junta de motores diesel, que provavelmente é tóxico. E infelizmente há muitos praticantes desse absurdo por aí, tanto que se encontra à venda em muitas lojas de materiais de construção.

Torque de aperto

O grande medo do encanador ao colocar excesso de fita teflon é torquear demais a conexão, quebrando alguma coisa. Mas, por incrível que pareça, não se encontra lugar nenhum qual seria o torque máximo de uma conexão PVC. Isso abre espaço para chutometrias e crendices.

O padrão NPT (roscas cônicas para hidráulica) especifica, para cada bitola, um "torque angular". Por exemplo, para roscas de 1/2", 4.5 voltas à mão, mais 3 voltas com chave. Para roscas de 3/4" é basicamente a mesma coisa.

A regra acima não leva em conta qualquer selante que engrosse a rosca, tipo fita teflon, então é preciso exercitar algum julgamento, principalmente ao usar fio veda-rosca, provavelmente não será possível fazer as 7.5 voltas.

Sabendo o aperto padrão (7.5 voltas) podemos usar esse número para estimar a folga de uma peça. Se ela rosquear sem resistência por mais de 4 voltas, está folgada e provavelmente exigirá mais vedante que o usual. Se rosquear menos, é uma peça apertada e não deve ser forçada até 7 voltas. A "distância" do ideal de 4 voltas vai mostrar o desvio — uma peça que dá aperto na segunda volta, ou não dá aperto antes do fim de curso, está absurdamente fora de especificação e não deve ser usada.

Alguns materiais na Internet sugerem algo como 3Nm de torque típico para conexões de 1/2". Considerado a força que uma pessoa normal consegue fazer com os dedos (sem usar o peso do corpo) é de 30N, isso se traduz em um aperto desconfortável (para a mão) com uma ferramenta de 10cm. Se usar uma chave de 20cm, o aperto não deve ir além da faixa de trabalho confortável.

Para conexões de 1", como as encontradas na saída de bombas, o torque de aperto é 8Nm, exigindo 40N com a mesma ferramenta de 20cm, aí sim tem de fazer força no limite do desconforto para um aperto suficiente.

Use uma ferramenta civilizada, tipo uma chave de bomba pequena ou uma chave inglesa pequena, e manipule a meio-comprimento. Isto ajuda a manter o torque aplicado sob controle. Evite aquelas enormes chaves de grifo, que insistem em vender para incautos mas são totalmente inadequadas para conexões residenciais, aquilo é para canos metálicos de 2" ou 4".

Apesar de já ter feito muita conexão com sobreaperto, com toneladas de fita teflon, ainda não me aconteceu de quebrar uma conexão (bata na madeira). Acredito que o maior risco de quebra é quando não se respeita a profundidade de rosca. Ou seja, a rosca bateu no fim de curso da conexão e o caboclo continua arrochando com chave. Aí é claro que alguma coisa vai quebrar.

A solução é simples: meça as peças, ou conte o número de fios de rosca, para saber até onde pode ir. Observe o fim de curso da rosca-fêmea (ou o quanto a conexão pode ir além da rosca, para não bater em nenhum componente interno, como no caso de bombas de água). Também observe se a rosca-macho fica "rasa" nos últimos fios, caso em que devem ficar de fora.

Faça ainda um teste de rosqueamento, sem teflon ou quase sem teflon, para ver até onde a peça vai sem esforço, e se a rosca parece terminar de repente (fim de curso) ou fica pesada aos poucos (rosca cônica).

Fazer essa análise também é útil pelo motivo oposto: se rosquear muito leve até o fim, falta material vedante e provavelmente vai vazar. Pode ser necessário tentar 2 ou 3 quantidades de vedante até atingir o objetivo: rosquear todo ou quase todo o comprimento útil da rosca, com aperto suficiente, porém não excessivo.

Mais um fator: qualidade das conexões. Fuja do mico! Era uma vez um nipple, comprado novinho, que não rosqueava mais que a metade, de tão pesado. E por mais fita teflon que se colocasse, também não vedava. Aí me ocorreu de tentar um nipple velho, todo mordido de ferramenta, só que era da Tigre, aí entrou e vedou imediatamente.

Não quer dizer que apenas Tigre presta. A grande maioria dos fabricantes nacionais, e a totalidade dos fabricantes nacionais bem conhecidos, faz um bom trabalho (e dá garantia e suporte se houver problemas). O ponto é que existem peças vagabundas no mercado, e você tem de ficar atento ao comprar.

Sempre haverá pequenas diferenças entre marcas, então é importante testar rosquear a seco comparando com aquele ideal NPT de 4 voltas à mão. Você pode fazer esse teste até na loja, antes de comprar, para conferir se uma peça está mais ou menos no padrão.

Também é importante saber se está lidando com rosca cônica ou reta.

Roscas cônicas ou retas

Em conexões hidráulicas e de gás, existem dois tipos de rosca: cônica padrão NPT, e reta padrão BSP.

A maioria das conexões hidráulicas (tubos, conexões, torneiras, etc.) é cônica padrão NPT. O torque de aperto fica progressivamente maior, tirando qualquer folga antes de chegar no fim de curso. Em tese, a rosca NPT veda por si mesma, e precisa ser apertada até a faixa de interferência. Na prática, precisa de um vedante, que também faz as vezes de lubrificante (para facilitar o aperto) e anti-engripante.

(Como mencionei antes, há peças fora de padrão no mercado, então pode acontecer de uma conexão não dar aperto até o fim de curso, ou dar aperto excessivo logo no começo. O ideal é descartá-la.)

A rosca reta BSP rosqueia facilmente até o fim de curso. A função da rosca é pressionar a face da conexão contra um elemento vedante, que pode ser de borracha, nylon, ou mesmo metal macio. Exemplos: pontas-fêmeas de mangueiras, flexíveis, entradas de água da máquina de lavar, uniões roscáveis, conexões de gás e refrigeração.

Não é necessário nem recomendado passar vedante nas roscas BSP, nem adianta arrochar se estiver vazando. Em caso de vazamento, é mais provável que haja problema com a borrachinha lá dentro. O aperto deve ser dado à mão, firmando com 1/8 ou 1/4 de volta de chave. Algumas peças (como adaptadores de mangueira) têm boa "pegada" e são feitas para apertar somente à mão.

O ideal é não misturar roscas BSP e NPT. Por coincidência, roscas 1/2" e 3/4" têm o mesmo passo nos dois padrões, mas em outros diâmetros o passo é diferente, e misturar BSP com NPT destruiria as peças.

Há peças BSP que não têm o local para acamar uma gaxeta. O ideal seria não usar BSP nesta situação, mas às vezes a instalação é assim, principalmente em GLP, e não, podemos trocar. Aí temos a missão ingrata de fazer roscas BSP vedar por si mesmas. O jeito é "embuchar" bem a rosca de forma cônica, criando artificialmente o torque de vedação.

Num exemplo pessoal, numa conexão de gás de parede, fui obrigado a usar fio veda-rosca mais 12 voltas de fita veda-rosca amarela por cima. Ao menos eram peças de metal, e os dois lados eram BSP, então não havia tanto risco de algo gastar ou quebrar.

Figura 5: Conexões parede-extensor, extensor-joelho e joelho-regulador são todas BSP, mas sem gaxeta, a muito custo feitas vedar pela combinação de Loctite 55 e muitas voltas de fita teflon de alta densidade.

No YouTube, vi um encanador usar o truque de aplicar uma primeira camada, rosquear provisoriamente para assentar a fita amarela, e então passar uma segunda camada por cima. Nunca tentei esse truque, mas talvez funcione.

Também existem peças para hidráulica no mercado que usam rosca BSP quando não deveriam. Noutro exemplo, comprei flexíveis para uma torneira, só achei um modelo na cor preta. Eles apresentaram diversos problemas na instalação: um entrava apenas 3 voltas na tomada de água quente (mas vedou) e o outro não vedou de jeito nenhum na tomada de água fria.

Aí constatei que os machos desses flexíveis tinham roscas retas, que está errado para um produto que rosqueia na parede. (E sim, eles foram feitos para rosquear na parede, veio até aquela vista redonda para esconder a conexão.) A solução foi "inverter" a conexão, instalando um niple duplo na parede, que é o que se faz quando o flexível da torneira (BSP) é comprido o suficiente para conectar direto à parede. Rosquear a fêmea BSP em macho NPT (de 1/2" ou 3/4") não causa problemas nesse caso, pois o torque é pequeno.

Algumas torneiras vêm com niple BSP de metal incluso na caixa, e até um carretelzinho de fita veda-rosca. É louvável porque a priori a torneira vem com todas as peças necessárias à instalação. Mas, devido aos problemas que enfrentei misturando NPT com BSP, nem tentei usar a peça.

Por último, as roscas BSP suportam um número indefinido de reapertos. Enquanto isso, as roscas NPT foram feitas para instalar uma vez, sendo progressivamente estragadas a cada reaperto. Portanto, em situações onde é prevista a desmontagem periódica, como um aquecedor de água que faz revisão anual, ou um flexível de gás que tem vida útil limitada, é obrigatório usar conexões BSP.

É inevitável trocar uma conexão NPT de vez em quando, mas queremos dimimuir a chance da peça NPT fêmea dentro da parede sofrer desgaste. Para minimizar esse risco, quando houver necessidade de manutenção, procure usar conexões novas e de qualidade. Não faça como seu pai, que fica guardando aquele monte de conexões velhas de 1500 marcas diferentes. Se achar que precisa, tenha em estoque peças novas, inclusive bujões e niples.

Trivia: A rosca reta é conhecida por BSP mas seu nome completo é BSP-P (BSP parallel). Existe a rosca BSP-T (BSP tapered) que é cônica, usada em hidráulica na maior parte do mundo desenvolvido, mas no Brasil adotamos o padrão NPT utilizado nos EUA e Canadá. Existe ainda a rosca métrica DIN, que concorre com BSP-T na Europa, embora a DIN seja mais usada em ambiente industrial.

Existe ainda o padrão NPTF (NPT Fuel), com conexão metal-metal que deforma durante o aperto e realmente veda por si mesma, mas apenas na primeira montagem, tornando-se equivalente à NPT comum se reaproveitada. Uma peça NPTF tem um perfil de rosca triangular, e a borda da rosca é literalmente amassada durante o aperto, formando um selo.

A conexão NPT cônica "deveria" vedar por si mesma. Ela até veda no sentido do comprimento, mas as bordas das roscas são arredondadas, enquanto os fundos das roscas são triangulares. Esta diferença deixa um espaço, formando um finíssimo canal em espiral (na verdade dois: um pelo fundo da rosca-fêmea, outro pelo fundo da rosca-macho). Esse espaço deve ser preenchido com algum vedante.

É por isso que, em muitas conexões com vazamentos, você desmonta, remonta, e depois de uma hora aquela gotinha miserável se forma, no mesmíssimo lugar que antes, e por baixo do teflon. É justamente porque ali é o final da rosca, é o ponto de saída do canal em espiral.

Conexões soldáveis

As conexões soldáveis de PVC ou CPVC são muito mais confiáveis que peças rosqueadas. Neste caso, seguir estritamente as instruções do fabricante é o que se deve fazer, e sempre dá certo. Se houver vazamento, o mais provável é que a peça veio quebrada.

Note que as instruções são bastante diferentes para PVC e CPVC. Por exemplo, lixar é obrigatório em PVC e proibido em CPVC.

Alguns encanadores usam cola de CPVC em PVC marrom por acreditarem que é "mais forte". Não entendo por que as pessoas fazem isso, arriscando-se a problemas futuros que não serão cobertos por nenhuma garantia. Não se trata de materiais tãão caros afinal de contas. Ou talvez a cor viva da cola CPVC, que lembra uma groselha, seja atraente?

Trivia: na gringa, é comum usar CPVC na instalação inteira, inclusive na água fria.

Trivia 2 para amadores: a cola de CPVC pode ser usada para tubulações de PVC branco para esgoto, para diâmetros de 60mm ou acima. Isso é um alento se você usou cola CPVC em PVC por engano; provavelmente não vai soltar. Na gringa, existem colas CPVC que também são garantidas em PVC. O erro oposto — usar cola PVC em CPVC — é sem dúvida mais grave porque envolve água quente.

Trivia 3: Em tese, canos de PVC soldável são para água fria, até no máximo 25 graus. Porém, mesmo água fria pode ficar mais quente que isso num verão brasileiro, e aí? Aí que o cano aguenta, mas a pressão admissível é reduzida. Canos comuns suportam 75mca, mas a 40 graus a pressão máxima é reduzida a 50% disso, i.e. 37mca. O limite absoluto é 60 graus, em que o PVC comum não tem mais resistência.

Pesquisei isso porque usei niples de PVC comum para ligar torneiras de água quente à parede, o que é errado. Mas não existem niples duplos de CPVC, e os de metal costumam ser BSP. Como usamos água quente a 40 graus e a pressão máxima é 26mca, não deve incomodar. Se fosse aqueles sistemas com caldeira, onde a água quente passa de 60 graus, teria de trocar.

O próprio CPVC enfraquece conforme a água esquenta, porém aguenta o dobro de pressão com água fria. A 60 graus, o CPVC suporta os mesmos 75mca, empatando com o PVC. O limite absoluto do CPVC é 80 graus; por conta disso, alguns preferem o PPR, que suporta 70 graus na pressão da norma, e 95 máximo absoluto.

PVC, PPR, PEX, cobre

No Brasil, PVC e CPVC dominam amplamente o mercado hidráulico, e isso há 40 ou 50 anos. Exalto aqui o pioneirismo da Tigre, empresa aqui da minha terrinha. A dinâmica local criada pela Tigre inspirou muita gente a empreender na mesma área e.g. Krona, Cipla, Amanco (que considero "local" por ter adquirido a Akros), Durin, Viqua, Plasbohn, etc.

Para água quente, a Tigre foi pioneira com o CPVC ("Aquatherm"). A Amanco introduziu o PPR, material interessante unido por fusão de verdade (usa-se uma maquininha para esquentar as peças) e que aguenta água ainda mais quente que o CPVC, tanto que é recomendado em instalações grandes tipo hotel. Na minha casa, o encanador me deu a opção e fiquei com o CPVC por ser mais fácil para um amador dar manutenção.

Nos EUA, o tradicionalismo ainda pesa muito em favor dos canos de cobre, que têm a vantagem adicional de suportar água quente, muito mais importante num país frio. Mas é um sistema caro e difícil de trabalhar. Mesmo por lá as alternativas plásticas estão crescendo a passo de granadeiro. Como dito antes, PVC comum nunca foi muito popular nos EUA, é mais coisa de europeu; e quando usam, é CPVC para água quente e fria. Também há tubos e conexões de ABS, utilizados em sistemas de esgoto pela sua resistência mecânica.

Um sistema que está ganhando popularidade no exterior, e também aqui, é o PEX. É um cano semi-flexível, como uma mangueira dura, barata, fácil de cortar e trabalhar. Curvas abertas podem ser feitas sem conexões. A vedação PEX é puramente mecânica, com anéis de metal crimpados, ou mesmo por simples encaixe. A instalação PEX é simples, rápida, limpa, e pode ser pressurizada imediatamente.

Mesmo no Brasil já é comum usar PEX para gás. Está entrando no mercado um tubo PEX para gás de ar-condicionado split, invadindo o último bastião do cano de cobre. A única grande desvantagem do PEX em construção é não poder ser chumbado na alvenaria; ele deve correr dentro de um cano-guia.

Diâmetros

Infelizmente para os amantes do sistema métrico, as polegadas ainda reinam em conexões roscáveis. Como dito antes, uma tomada de água na parede é quase sempre 1/2". As entradas de água de máquinas de lavar e outros equipamentos tendem a ser de 3/4", assim como mangueiras. Bombas de água tendem a usar 1" no mínimo.

Ao menos os canos usam medidas métricas, como o ubíquo PVC de 25mm. É interessante notar que 25mm é o diâmetro externo, ele equivale a 3/4" em termos de vazão. O cano de 32mm equivale a 1" dos gringos, e assim por diante.

Vedação no passado

Água e gás aparentemente não gostam de viver confinados, é difícil mantê-los dentro de canos, mas aparentemente isto já foi tarefa muito mais difícil e perigosa.

Antes do PVC soldável, só havia PVC branco roscável. E antes dele, tubos de ferro. Imagino o trabalho que dava para fazer, abrindo rosca em cada pedaço de cano, com uma chance de vazamento a cada curva ou emenda. Não admira que as pessoas economizassem nos encanamentos, tentando posicionar todos os "cômodos molhados" adjacentes, fazendo apenas um banheiro, usando instalações aparentes, etc.

A fita teflon é uma invenção relativamente recente. Antes disso, vedava-se roscas com fibra vegetal de cânhamo ou sisal, na forma de barbantes ou fibras soltas, "dopadas" com algum material oleoso ou resinoso. (O Loctite 55 é uma reedição dessa ideia antiga, porém com fibra de nylon e um dope que acredita-se ser à base de Teflon.)

Na presença de água, a fibra natural incha e veda, mas também apodrece, então o "dope" é necessário. Até os anos 1970, era comum usar tinta zarcão, que é um óxido de chumbo (não admira que fosse um bom preservativo). Hoje em dia há dopes atóxicos. A fibra natural ainda é utilizada em tubulações de metal de grande diâmetro.

Uma vantagem da tubulação de cobre é ser toda unida por soldagem (na verdade, brasagem). Um serviço minimamente bem-feito não tem como vazar e suporta pressões enormes, não admira tantas pessoas ainda façam questão de cobre no mundo desenvolvido. Antigamente a solda costumava levar chumbo, hoje não mais, assim como aconteceu com a solda para eletrônica.

Tubos de ferro sem rosca eram (e às vezes ainda são) unidos com estopa de calafetar e chumbo. Sim, de novo, o onipresente chumbo. É um processo punk e perigoso, conforme se pode ver neste vídeo, fora os riscos de contaminação do próprio encanador e da água que passa pelo cano.

Esgoto e respiros

Talvez seja diferente na sua região, mas por aqui os encanadores que trabalham em instalações residenciais têm dois cacoetes relacionados a esgoto, um bom e um ruim.

O cacoete bom é separar "águas negras" (vasos sanitários) de "águas cinzas" (chuveiros, pias e lavanderias) pela máxima extensão possível, embora isso não seja exigido pela norma ABNT. Acredito que o motivo seja a cobertura insuficiente de tratamento de esgoto, então usa-se muito o sistema de fossa séptica: uma primeira fossa aeróbica e uma segunda fossa anaeróbica. Jogar água de cozinha e principalmente de lavanderia na fossa aeróbica prejudicaria muito o seu funcionamento.

Pessoalmente acho que essa separação deveria ser obrigatória. Uns conhecidos moravam numa casa onde a cidade finalmente implementou tratamento de esgoto, e então exigiu separação de águas cinzas e negras, inclusive entrando nas casas e jogando água com corante para verificar. Quem não fazia a separação de águas, teve de quebrar muito mais piso e calçada para se adequar.

O cacoete ruim é desprezar a questão do respiro de esgoto, também chamado de tubo de ventilação. Hidráulica de esgoto tem uma regra básica: a pressão deve ser sempre zero. Os tubos, conexões e técnicas de emenda não são feitos para suportar pressões apreciáveis. Para garantir isso:

Quando uma onda de água desce por um tubo de esgoto, ela cria pressão de ar à frente e um vácuo na esteira. Se não houver um respiro à frente, a sobrepressão poderia romper um tubo ou causar um vazamento. Mas o problema mais provável é simplesmente um escoamento deficiente. E se não houver respiro atrás, o vácuo tende a esvaziar sifões de ralos, pias e vasos sanitários, permitindo o retorno de mau cheiro. Se o volume de água for grande e o tubo chegar a ficar 100% preenchido, e/ou o trajeto incluir uma queda vertical, esses efeitos são amplificados.

Um local onde o efeito de esvaziamento por sifonagem é propositado, é no vaso sanitário. Durante a descarga, quando a água enche completamente o sifão, ele dá aquela "engolida" que esvazia rapidamente o vaso arrastando quaisquer sólidos junto. Para isso funcionar direito, a canalização pós-vaso deve estar em ordem e bem ventilada. Todo mundo já usou um vaso com escoamento lento, você dá dez descargas e o "marinheiro" fica boiando e se recusa a ir embora...

Em casas americanas, você vê inúmeras "chaminés" nos telhados, que na verdade são respiros de esgoto. Cada tubo de descida é prolongado para cima até sair pelo telhado, e cada ramal de esgoto é meticulosamente ventilado. Os "Y" que vertem do ramal para o cano de descida são curtos, para que a água derrame sem ter chance de tomar 100% do espaço.

No Brasil, o respiro é exigido pela norma ABNT e costuma ser feito em prédios, pois a falta dele causaria problemas mais severos (imagine a pressão e o vácuo criados por uma descarga ao longo de um tubo de descida de 20 andares). Já em residências, onde a hidráulica tende a ficar a cargo de um encanador autônomo, é quase impossível entrever respiros nos telhados.

Em casas antigas, tem aquele tradicional "cheiro de fossa" que aparece em véspera de chuva, quando baixa a pressão atmosférica e a sobrepressão do esgoto tem de escapar por algum lugar, geralmente por onde não devia. Na minha casa, o encanador até tentou fazer um respiro junto das fossas, com uma chaminé bem alta encostada numa árvore, mas havia um trecho em declive no cano, e a umidade terminava por selar esta saída de gás. Consertamos isso colocando um respiro na bitola da norma (50mm) e com a queda para o lado certo.

Infelizmente, não há nenhum respiro nos tubos de descida da nossa casa, ainda que isso não cause maiores problemas. A separação de águas cinzas e negras é um antídoto parcial e.g. ajuda a evitar que o vácuo produzido por uma descarga esvazie o sifão da pia adjacente.

Outra KHD, essa de ordem mais prática, é esquecer de colocar ou conferir os sifões nos ralos. Em pelo menos um caso pessoal, o ralo é tão fundo que não tinha como enfiar a mão dentro e encaixar o sifão. (Não sei se foi KHD do encanador ou do pedreiro que fez o piso.) A conseqüência era um retorno de mau cheiro, impossível de resolver "por cima"; ajudou bastante usar um ralo antiespuma, mas estava longe de ser uma solução 100%. Por sorte, a casa tem um crawl space e adaptamos um sifão U nessa linha.

O sifão U adiciona um risco de entupimento — por isso ele sempre deve ter um ponto de inspeção — mas funciona melhor que os ralos sifonados em outros quesitos. Na gringa, cada saída de pia, chuveiro ou máquina de lavar possui um "sifão P", ou seja, um sifão U seguido por um trecho reto. O sifão P costuma ser externo no caso de pias e embutido nos demais casos. (O antigo sifão S é obsoleto pois é mais fácil o fluxo preencher 100% do cano na queda do "S" e sugar fora a água do fecho hídrico. O sifão P seguido do tubo de descida encoraja a água a derramar, mantendo livre a circulação de ar.)

Nossos encanadores locais adoram usar ralo sifonado porque é fácil ligar diversos sub-ramais de águas cinzas no ralo do respectivo cômodo. Ademais, o ralo acaba fazendo as vezes de respiro e de ponto de inspeção. Porém o sifão U leva duas grandes vantagens: não permite retorno de espuma (problema muito comum quando a saída da máquina de lavar vai para um ralo sifonado) e não seca facilmente (um ralo sifonado tende a perder o fecho hídrico em 2 semanas por evaporação ou mesmo por um vácuo de pequena monta). Em pias, o sifão P tem vazão muito melhor que aqueles sifões em forma de copo, e menos tendência de entupir com qualquer meia dúzia de fios de cabelo.

As desvantagens do sifão U em cada ponto de esgoto são: o custo, a maior dificuldade de resolver um entupimento (principalmente se for embutido e não tiver ponto de inspeção) e a obrigatoriedade de haver um respiro correto pós-sifão. E como dissemos antes, muitas residências não têm um esgoto correto na questão do respiro.