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Visita a Engenheiro Bley

Desta vez o passeio ferroviário semianual adentrou os rincões do Paraná, até um pátio/triângulo (e antiga estação) denominado Engenheiro Bley, entre as cidades de Lapa/PR e Balsa Nova/PR.

Figura 1: Saída do pátio de Eng. Bley, na direção de Rio Negro/Mafra

Eng. Bley é um ponto estratégico da malha ferroviária sul, pois é o "ponto de decisão" entre o porto de Paranaguá/PR, porto de São Francisco do Sul/SC e Tronco Principal Sul até o RS. Todo o tráfego ferroviário típico do Paraná passa por ali.

O lugar é "central" de duas formas completamente diferentes: é estratégico para a ferrovia, e ao mesmo tempo está exatamente no meio do nada. A ferrovia Curitiba-Ponta Grossa segue de perto o Rio Iguaçu e nesta região o vale do Iguaçu apresenta enormes banhados. O mapa abaixo mostra a localização, note que é praticamente equidistante das rodovias que cortam a região:

Figura 2: Localização de Eng. Bley no mapa. Fonte: Google Earth

Em 2019, a região ainda é francamente rural, mas a estrada de terra entre Lapa e Balsa Nova, de onde deriva o acesso à estação, está bem melhor que há dez anos atrás. O acesso é tranquilo vindo de qualquer destas duas cidades. Desconfio que a estrada foi melhorada para que seja uma alternativa permanentemente praticável pelo tráfego local, pois são escassas as rodovias que ligam a BR-277 à BR-476. Há até um par de placas indicativas. O acesso final a Engenheiro Bley continua sendo uma estradinha bem estreita, mas nada que exija 4x4.

O solo do lugar parece argiloso-arenoso: muita poeira em dia de sol, e preocupante na época chuvosa. Há muita mineração de argila na área, em dias não-santos os caminhões serão incômodos companheiros de tráfego. É estranho pensar que Eng. Bley já foi estação ferroviária de passageiros. Pelo número de pessoas que mora em torno nos dias de hoje, seria impossível desconfiar.

Como se pode ver na figura abaixo, o pátio de Eng. Bley é triangular. Para um observador minimamente dotado de imaginação lúbrica, quase todo triângulo ferroviário apresenta curvas interessantes, "orgânicas" até.

Figura 3: Foto de satélite do pátio de Eng. Bley. Fonte: Google Earth.

Vindo da Lapa, a paisagem é muito bonita, pois começa num patamar alto, deslindando os campos a perder de vista. Vindo de Balsa Nova, a atração é a região dos banhados do Rio Iguaçu.

Figura 4: Vista da estrada entre Lapa/PR e Eng. Bley, lado oeste

Apesar do isolamento e de não haver sequer uma bodega para comprar uma garrafa de água, Engenheiro Bley é um paraíso para os train geeks: trilhos para todo lado e garantia de que o trem vai passar.

Figura 5: Plataforma e prédio da antiga estação de Eng. Bley

Cada lado do triângulo possui linha dupla ou tripla, para que funcione como pátio de cruzamentos. A distância entre os vértices é de uns 600-800m, e as linhas duplas se estendem muito além, por mais de 1km, então uma simples caminhada que atinja as três pontas de pátio é diversão para duas horas ou mais.

Figura 6: Pátio de Eng. Bley, saída para Rio Negro/Mafra

Outro fator de atratividade de Eng. Bley é a abundância de pontes ferroviárias. Todas as três saídas do pátio acabam em pontes. Tanto a saída de Curitiba quanto de Ponta Grossa cruzam o Rio Iguaçu em seguida, enquanto a saída para Rio Negro cruza um afluente do Iguaçu duas vezes seguidas.

Não bastasse isso, ainda há ruínas de pontes antigas, e também dos próprios traçados antigos da ferrovia Curitiba-Ponta Grossa e do Ramal do Rio Negro. Dependendo de quão longe você quer andar, pode encontrar até os vestígios da Serrinha, onde ficava o triângulo até 1936, ou da "Bley Velha" que ficava a 1.5km SSE, com algumas ruínas ainda de pé perto dos trilhos.

Figura 7: Vista da saída para Curitiba

Neste ponto de confluência de ferrovias é possível ver a diferença de padrão na construção e manutenção. A ferrovia Curitiba-Ponta Grossa possui semáforos, desvios com comando remoto, parte dos dormentes é de cimento, a fixação dos trilhos nos dormentes é Pandrol (mola) em vez do tradicional parafuso etc. As confluências para Rio Negro não têm nada disso.

Lembrando que antigamente a saída para Rio Negro era simplesmente um ramal, ou seja, ia até Rio Negro/PR e parava. A travessia do rio para Mafra/SC e a ligação com a ferrovia São Francisco é um pouco mais recente.

Na foto abaixo é possível ver as caixas de comando dos desvios:

Figura 8: Entrada do pátio de Eng. Bley, vindo de Ponta Grossa. Linhas à esquerda vão para Curitiba, linhas à direita vão para Rio Negro/Mafra

Muito próximo a este ponto, a ponte sobre o glorioso Rio Iguaçu. Construída em alvenaria, é fácil atravessá-la à pé, e possui inclusive aquelas "cestinhas" para os incautos se abrigarem se forem pegos de surpresa pelo trem.

Figura 9: Ponte sobre o Rio Iguaçu, próxima ao local da figura anterior.

Ainda sobre pontes, Engenheiro Bley é geograficamente próxima (10km) da famosa Ponte dos Arcos. Uma opção é ir à pé, o que pode ser interessante pois o caminho é rico em paisagens e obras de arte. De automóvel o caminho mais curto dá uns 35km, via centro de Balsa Nova que é onde está a ponte rodoviária mais próxima.

Figura 10: Os grafiteiros quebram a monotonia dos vagões da ALL
Figura 11: Ponte ferroviária sobre a BR-476

O ramal do Rio Negro foi retificado em praticamente toda sua extensão. A linha original corria a leste da atual. Um resquício que sobreviveu em grande estilo foi uma ponte, convertida em ponte rodoviária, na rodovia estadual entre Campo do Tenente/PR e Lapa/PR.

Figura 12: Ponte rodoviária da rodovia PR-247, antiga ponte ferroviária do Ramal do Rio Negro

A rodovia PR-247 "herdou" o leito da antiga ferrovia, o que explica algumas curvas bem fechadas, perigosas e redondinhas, incomuns numa rodovia moderna. A cidade de Campo do Tenente ainda conserva a estação ferroviária original, em uso como câmara legislativa, e uma bela casa em frente, resquício de tempos mais românticos.

Figura 13: Antiga estação ferroviária de Campo do Tenente/PR
Figura 14: Casarão Villa Anna, em frente à antiga estação, Campo do Tenente/PR

Na volta, dei uma passada "noblesse oblige" no pátio de Rio Negro. Voltei por São Bento do Sul, onde conversei com o ambientalista e historiador Henry Henkels — não sem um certo temor, afinal temos ideologias políticas opostas e nossas discussões na Internet muitas vezes ficaram acaloradas. Mas constatei que aquele velho axioma "as pessoas comportam-se melhor ao vivo" continua valendo :)

Pelo Henry soube de um trabalho de sinalização de estradas interioranas para a alegria dos mountain bikers. É análogo ao "Vale Europeu", porém mais elaborado, com as placas naquele padrão dos trilheiros.

Por puro acaso, acabei passando por uma estradinha assim sinalizada. Deu aquela vontade de estar de bicicleta. Quem sabe em breve, agora que a muié tirou a carteira de navalhista, digo, de motorista.

Figura 15: Placa de sinalização na Estrada dos Bugres, São Bento do Sul/SC

E é isso aí. Despeço-me com o playlist dos videos do passeio. Enjoy.