PRONAF significa Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar.
Através deste programa, o agricultor familiar pode ter diversos benefícios, como financiamentos a juro baixo, descontos na compra de veículos e implementos... e possibilidade de comprar terrenos rurais menores que a Fração Mínima de Parcelamento (FMP).
PRONAF é só mais um daqueles tantos programas governamentais que começam com uma boa intenção e acabam sendo desvirtuados, virando apenas mais um obstáculo burocrático.
Em vez de criar um ambiente econômico para que qualquer um possa emprestar a juros baixos, adquirir veículos a preço justo, e negociar terras do jeito que bem entender... não, o governo coloca impostos altos e regras draconianas, para em seguida criar uma bolha de bondades para o mítico agricultor familiar, tão endeusado pelos socialistas de boutique.
Tem toda aquela mística de "segurar o homem do campo no campo", de reforma agrária, de MST. De achar que o pequeno agricultor familiar é uma espécie de reserva moral da nação. Impossível não lembrar da doutrina de "Sangue e Solo" dos nazistas, e da doutrina de Pol Pot.
Noves fora que eu aprecio mais o sertanejo médio do que o cosmopolita médio, acho que todo mundo merece a mesma consideração. Um catador de papelão é tão cidadão quanto o empresário, o artista e o político. E o agricultor familiar não é melhor que os outros quatro. E igual consideração deve ser traduzida em impostos iguais e facilidades iguais.
Mas o lobby da agricultura é forte e o PRONAF segue existindo.
O resultado é que o conceito de "agricultor familiar", por conceder vantagens, vai sendo distorcido. É natural que, se um automóvel custa 30% menos para um agricultor familiar, muita gente vai tentar se enquadrar como agricultor familiar para obter esse benefício.
Muito, muito antes dessa modinha atual de "voltar pro mato", soube de pessoas que compraram terras baratas num cafundó inacessível, só para declararem-se agricultores e comprar picape.
Do ponto de vista burocrático, para ser considerado agricultor familiar e usufruir dos benefícios, é preciso obter uma DAP. DAP significa "Declaração de Aptidão ao PRONAF".
Para obter a DAP, é preciso possuir ou arrendar uma propriedade rural pequena, com o CCIR em dia e tal. Também é preciso comprovar atividade rural, com notas fiscais, cadastro estadual ou CNPJ rural. Também existe um limite máximo de renda anual, e uma exigência que uma porcentagem mínima dessa renda venha da atividade rural.
Aqui começam os problemas.
Se você não é agricultor, mas pretende ser agricultor, não vai conseguir a DAP num primeiro momento, pois não possui a terra e/ou nunca comercializou produção rural. Por outro lado, é difícil começar sem os benefícios do PRONAF. Vira um problema "ovo ou galinha".
Existe uma presunção que o agricultor familiar descende de agricultores familiares e já trabalhe um pedaço de terra da família, já tire parte da renda da terra...
Da mesma forma, se você vem da cidade e tem uma renda relativamente alta, e 0% dessa renda advém de atividade rural, você está desenquadrado. O que resta fazer é mentir, e rezar para não pedirem documentos adicionais, tipo declaração do Imposto de Renda.
Se você quer começar com um sítio pequeno, menor que a FMP (2 hectares no Paraná), possuir uma DAP possibilita desmembrar o sítio no registro de imóveis, desde que a parte remanescente seja maior que a FMP, ou o outro dono também possua DAP. No tempo presente, qualquer terra maior que a FMP é proibitivamente cara para quem pretende começar do zero. Mas quem começa do zero não consegue DAP. Resta adquirir uma fração ideal, ou uma posse no contrato de gaveta, e tentar resolver o problema no futuro.
Vou aproveitar para lembrar que não é necessário possuir DAP, nem ter cadastro rural, para adquirir terra rural. Estou dizendo isso porque fiz todos esses cadastros, pois achava que só podia possuir terra rural se tivesse papelada de produtor rural (sim, burrice, eu sei). No DAP, a coisa emperrou; quando fui dar a má notícia ao vendedor, finalmente descobri que tinha sido em vão.
Essa lenda surge por contraposição: como disse antes, muita gente compra ou arrenda uma nesga de terra para obter DAP e seus benefícios, ou faz cadastro de produtor rural para obter eletricidade mais barata. Aí os leigos fazem a associação na mão contrária.
A outra lenda é que tem financiamento barato para qualquer coisa, uma vez obtido o DAP. Uns conhecidos conseguiram DAP, o vendedor da terra garantiu que conseguiriam financiar a construção da casa com juros praticamente zero, mas na prática a teoria foi outra. Tiveram de optar por um construtor sub-ótimo, só porque ele oferecia financiamento próprio. Os descontos na compra de carro para produtor rural também já não são mais tão generosos como no passado. A tática está ficando manjada, ao que parece.
O último e maior problema do DAP é que o processo de concessão muda de lugar para lugar. Em cada município, é uma entidade diferente que analisa os pedidos: pode ser a prefeitura, pode ser o sindicato rural, pode ser o MAPA ou outra entidade de apoio técnico à agropecuária. Em alguns lugares, concede-se o DAP para qualquer solicitante, basta submeter a papelada. Em outros, é feita uma análise profunda, pedindo inclusive declaração de IRPF.
Em resumo, o DAP é concedido de forma meio arbitrária, conforme o avaliador vai com a sua cara ou não. Muita gente obtém DAP de forma fraudulenta para comprar carro barato, enquanto isso muito agricultor familiar fica sem DAP e sem financiamento. Ouvi falar de agricultores de décadas que esqueceram de renovar a DAP e tiveram imensa dificuldade para obtê-la novamente, apesar de provarem cabalmente a situação de agricultor familiar.