ATUALIZAÇÃO: devido a inúmeros abusos de transeuntes e campistas, além do tráfego excessivo e incompatível com o local, o acesso aos Campos do Quiriri está novamente restrito. Pode-se agendar visitas, mas são guiadas e cobradas. Também é possível alugar uma casa, o que dá a chance de conhecer o local mais demoradamente, porém há uma longa fila de espera.
Fui dar minhas voltas e quase por acaso cheguei à região dos Campos do Quiriri, que sempre tive muita curiosidade de conhecer, mas que por um motivo ou por outro ainda não tinha visitado, apesar de já ter chegado perto duas ou três vezes.
Em Santa Catarina, o Morro da Igreja em Urubici leva toda a fama por ter grande altitude (1800m) e fazer muito frio. A estrada asfaltada que conduz ao pico também ajuda muito, é claro. Mas a região entre Joinville e Curitiba também possui altitudes formidáveis: 1325m na Serra Queimada, mais próxima a Joinville; 1538m na parte catarinense dos Campos do Quiriri, e até 1680m na parte paranaense.
O acesso a estes lugares é relativamente difícil, pelo menos para quem não se dispõe a enfrentar uma caminhada forte. Na BR-376, perto da PRF depois da subida da serra, pode-se subir o Morro dos Perdidos de automóvel. Com 1400m, este morro ainda faz parte da cadeia montanhosa do Quiriri. O último trecho exige 4x4 mas pode ser percorrido à pé por qualquer pessoa saudável, e a paisagem no ponto onde chega o carro já é incrível.
Os Campos do Quiriri são acessíveis por estrada mas ao longo dos anos já foi sujeito a diversos tipos de restrição. Antigamente era preciso dar uma garrafa de cachaça a posseiros, depois era preciso pedir autorização na Ciser (o dono desta empresa comprou parte dos campos para proteger nascentes). Até achar o ponto de entrada era uma aventura à parte, embora a estrada serpenteando morro acima seja visível de longe com tempo bom.
Hoje em dia, o caminho para o local é fartamente sinalizado desde Campo Alegre. Quem vem de Joinville pode tomar a estrada Laranjeiras, ou então ir até Campo Alegre e dirigir-se a Bateias de Baixo, Bateias de Cima ou São Miguel, e seguir as placas a partir dali. Também é possível chegar facilmente a partir do Paraná, vindo de Tijucas do Sul pela localidade de Ambrósios, ou tomar a última estrada à direita a partir da BR-376, antes de descer a serra. Este caminho é bonito pois margeia o morro mais alto dos campos (1680m).
Uma das "lendas" do caminho para subir o Quiriri é a história das porteiras. A maioria das pessoas teria medo em transpassar uma porteira fechada, mas ali isto é tolerado porque há diversas propriedades que são enclaves, inclusive uma mina de caulim. Contei três porteiras, duas das quais estavam fechadas, mas sem placa de entrada proibida. O protocolo é deixar as porteiras no estado em que se encontravam. Nesta região criam-se vacas, cavalos e até cabras, todos à solta.
Outra "lenda" é a necessidade de veículo 4x4 para subir morro acima. A estrada é cavada no barro puro e tem forte gradiente. Mas como ela tem de ser mantida suficientemente boa para os caminhões da mina da caulim circularem, acredito que qualquer automóvel razoável consiga subir com tempo bom.
Descer exige cuidado e freio-motor suficiente, e ficar bem de olho na temperatura dos freios. O maior perigo seria pegar chuva estando lá em cima, porque o caminho de descida vira um sabão.
Não foi a pior estrada que já enfrentei nas minhas andanças — já entrei em enrascadas maiores para visitar estações ferroviárias abandonadas, e eu nunca faço trilhas, sempre uso estradas regulares que aparecem no mapa. A via é razoavelmente larga, veículos podem cruzar-se sem nenhum problema.
Atualização 2020: a via ainda é praticável, porém está mais complicada que em 2016. É recomendável ir de veículo 4x4 ou pelo menos de tração traseira.
O local é praticamente um castelo de cartas geológico: os morros são feitos de barro, com uma e outra pedra solta misturada. De 850 a 1100m de altitude, a vegetação ainda é mata fechada, a mesma que se observa em toda a região. Acima disso, as árvores dão lugar a arbustos altos, e acima de 1200m sobra apenas um mato rasteiro. Apenas os pinus de reflorestamento conseguem crescer acima desta altitude, quando uma semente sobe por acidente.
E isto é mesmo um acidente quando acontece, porque o pinus é considerado uma espécie exótica e invasora. Se os pezinhos de pinus não fossem extirpados conforme medram aqui e ali nos campos de altitude, a seu tempo tomariam conta da paisagem. Provavelmente comprometeriam as nascentes, pois toda a água subterrânea seria então consumida e evaporada pela floresta.
Do ponto de vista ecológico, a estrada nunca deveria ter sido construída, pois é um foco de erosão que a parca vegetação destes campos de altitude não consegue segurar.
Um argumento a favor de usar veículo 4x4 nessa estrada é a conservação da própria estrada. Com tração integral, as rodas não patinam, o que evita mais erosão.
A paisagem incrível e a temperatura de 21 graus em pleno verão dão a sensação de um mundo à parte.
Além da grande altitude, esta região distingue-se por ser o divisor de águas entre leste e oeste, isso a poucos quilômetros do oceano. A água que corre para leste forma rios relativamente pequenos, mas localmente importantes para as cidades no nível do mar. A água que corre para oeste também acaba no oceano, mas só depois de passar pelos rios Negro (que nasce aqui), Iguaçu, Paraná, e finalmente deságua lááá no Rio da Prata.
Aparentemente o local já foi sede de uma fazenda de verdade. Ela inclusive consta no mapa. As demais estradas que conduzem desse ponto para outros picos não constam na carta, então devem ser mais recentes.
O local não é desabitado, todavia. Há pessoas morando lá e umas poucas cabeças de gado pastam por toda parte nos campos.
No mesmo nível da fazenda, há uma mina de caulim, que é outra atividade pouco recomendável do ponto de vista ecológico. Porém a mina é menor do que eu imaginava, e parece estar bem contida numa depressão do terreno.
Infelizmente a subida final para o famoso Morro da Antena ou Morro Bradador, de onde é possível enxergar as cidades de Joinville e Garuva, bem como o oceano, estava fechada. Além da porteira com cadeado, havia uma placa de entrada proibida. A estrada também está em más condições (o pessoal de radioamadorismo tem usado quadriciclo para vencê-la), e não seria neste dia que eu tentaria uma subida tão íngreme à pé.
Antes da fazenda há um morrote, ao lado da estrada, que proporciona a melhor visão da região, salvo talvez o morro da antena. Foi onde fiz a maior parte das fotos. Notei que o pessoal sobe, ou tenta subir, de carro neste lugar, o que é coisa que não se deve fazer pois a vegetação rasteira desses campos de altitude sofre muito, conforme se pode ver na foto abaixo.
Atualização 2020: uma vala de escoamento pluvial foi cavada ao longo da estrada, de modo que não é mais possível subir de carro neste morrinho.
Um outro morro com excelente vista do vale do Quiriri é o Tijuco Preto. Este tem estrada boa até o topo, há diversas antenas lá em cima. Porém, não lembrei de visitar este ponto em 2016, e a entrada está proibida em 2020 mesmo com autorização para a estrada principal. Pena... Segue duas fotos mais recentes como prêmio de consolação.
Na volta, ainda parei no mirante do início da Estrada Rio do Júlio, de onde se pode ver uma grande cascata do Rio Cubatão. Este rio também nasce na região dos campos de altitude, entre a Serra Queimada e os Campos do Quiriri. Curiosamente, ele nasce correndo para oeste, mas faz uma grande curva em U, e finalmente desce para Joinville.