UPDATE: o conteúdo do artigo foi revisitado neste vídeo (tosco) que fiz:
Os teclados Unicomp são, por diversas razões, "museus vivos" da era dourada do IBM PC. Largamente apreciados por serem teclados mecânicos, e também por serem os únicos ainda em produção que utilizam o mecanismo de buckling springs ("molas que dobram").
Teclados de computador já foram peças de hardware construídas com esmero. Um teclado de PC XT custava, em dinheiro de hoje (2016), uns 900 dólares. (Um PC completo custava perto de 6.000 Trumps segundo essa mesma conversão.) Não havia mouse nem tela sensível ao toque; o teclado era realmente o único dispositivo de entrada, o PC era primariamente um instrumento de trabalho, portanto o teclado tinha de ser realmente bom.
O funcionamento da buckling spring pode ser visto na animação abaixo.
A genialidade desse mecanismo é utilizar uma única mola para realizar três tarefas: o retorno da tecla, o clique mecânico tão apreciado pelos datilógrafos, e a própria atuação da chave (o "pezinho" sobre o qual a mola se apoia na parte de baixo).
Na verdade, o mecanismo foi, na época, criado para diminuir custos, porque era muito mais barato que chaves individuais. Sucedeu diretamente o mecanismo denominado beam spring, que possuía duas molas, uma delas funcionando de forma semelhante a um platô de embreagem de carro. Além de mais caro, era menos confiável. Outro exemplo é a chave Cherry MX "azul", que possui uma mola helicoidal só para o retorno, uma segunda mola plana apenas para o clique táctil, e uma peça móvel adicional que faz o clique audível e fecha o contato.
O clique audível e táctil é apreciado por quem digita muito e rápido, porque ele "informa" quando a tecla fez contato. Com a prática, não se pressiona a tecla até o fundo, mas apenas até o ponto do clique. Numa máquina de escrever elétrica, esse feedback sensorial era proporcionado pela própria vibração do funcionamento, principalmente numa máquina robusta como a Selectric da IBM.
Segue um vídeo com o meu teclado Unicomp em operação:
Quando comecei a trabalhar com informática, isso lá pelos idos de 1988, um e outro teclado da empresa tinha esse clique mecânico. Alguém chegou a tirar uma tecla para me mostrar como o negócio funcionava. Depois, os teclados foram ficando cada vez mais baratos e menos satisfatórios, mas ninguém deu bola porque era o alvorecer da multimídia: o que importava era o PC ter placa de som e monitor colorido...
A IBM vendeu o ferramental dos teclados Model M para a Lexmark, que também acabou deixando esse mercado. Um engenheiro comprou esse ferramental e fundou a Unicomp, uma pequena empresa que dedica-se a continuar produzindo o venerável teclado. A empresa também oferece modelos PC-122, verdadeiros órgãos de igreja com 122 teclas cuja origem é o terminal IBM 3270. As únicas mudanças tecnológicas desde o Model M são a interface USB e a adição das "teclas Windows" (que também viabilizam seu uso no Mac).
O "tchan" dos teclados Unicomp são as teclas em si. De resto, ele é enorme, feio, de aparência antiquada, de linhas quadradas e toscas como eram todas as coisas nos anos 1980. A carcaça do teclado mostra a idade dos moldes, a textura do plástico já não está mais 100% regular. A carcaça do meu Tesoro Tizona é muito mais resistente à torção e bem-acabada, e custa menos que o Unicomp. O Unicomp usa um chassi interno mais fino que o Model M da IBM, e a carcaça plástica também é mais fina. É preciso reconhecer que se trata de uma réplica do modelo vendido pela Lexmark até 1996, não é uma réplica do produto IBM original, como seria o ideal.
A rigor, o próprio IBM Model M já é uma segunda geração de teclado de "baixo custo", depois das beam springs e do teclado IBM Model F. O Model F, fornecido com os PC XT e os primeiros PC AT, era melhor em termos estruturais, embora também usasse buckling springs. Outra vantagem do Model F é ser um teclado capacitivo, ou seja, nada de contatos para desgastar, enquanto o Model M usa membrana.
O Model M ganhou popularidade rapidamente frente ao Model F por conta do novo layout, embora eu ainda prefira o layout antigo. Infelizmente, ninguém produz nada parecido com o Model F há décadas, muito embora haja um projeto de crowdsourcing destinado a ressuscitá-lo, para quem estiver disposto a pagar a bagatela de 325 dólares (fora frete e quase 100% de imposto).
Sendo um teclado "velha escola", ele não possui teclas multimídia, nem mesmo através de uma tecla Fn, o que é um pouco chato no Mac porque o único jeito de remapear os "shortcuts" multimídia é instalando software de terceiros. É uma desvantagem importante frente a teclados mecânicos mais atualizados (até layouts enxutos como o Happy Hacking dão acesso a funções de multimídia através de Fn).
Outra limitação do Unicomp é não ser NKRO (N-key rollover). Ele é 2KRO, o que significa que ele registra no máximo 2 teclas pressionadas simultaneamente (os modificadores correm por fora dessa soma). 2KRO não é um problema para digitação, mas pode ser um problema em alguns jogos. (Apesar de que joguei Counter-Strike com esse teclado, onde se usa até 5 teclas simultâneas e não percebi problemas. Considere ainda que eu jogo muito mal...)
Possuir e utilizar um teclado Unicomp é para connoisseurs. É como dirigir um carro antigo, como se se pudesse comprar um carro antigo 0km e por um preço acessível. Além do mecanismo exclusivo das teclas, que muitas pessoas consideram superior a qualquer outro, poder usar um teclado produzido no mesmo molde plástico que a IBM utilizava nos anos 1980 é uma demonstração de respeito a um importante capítulo da história da computação.
Bem, e o que eu achei do buckling spring? Sem dúvida o ruído de funcionamento é espetacular. Estando acostumado com um teclado mecânico de "chaves azuis", as teclas do Unicomp são bem mais pesadas. Dizem que as chaves Cherry MX "verdes" são as mais semelhantes, pois são justamente mais pesadas que as azuis, mantendo os cliques táctil e audível. Preciso digitar um bocado ainda, por alguns dias seguidos, para fazer um juízo definitivo. O timbre do ruído ficaria ainda melhor se o teclado contasse com um chassi metálico, como era o caso do Model F.