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Estruturas algébricas

Este texto é um apanhado de informações sobre estrutras algébricas, a quem interessar possa. Presume-se um conhecimento básico de aritmética e teoria dos conjuntos.

Produto cartesiano

É um cruzamento de dois conjuntos. Formam-se pares ordenados com todas as combinações possíveis dos elementos dos conjuntos. Por exemplo,

A = {Ana, Beatriz, Carla}
B = {Daniel, Edson, Fábio}
A×B = {(Ana, Daniel), (Ana, Edson), ... (Carla, Fábio)}

Como é claro, o número de elementos do produto cartesiano é o produto dos tamanhos dos conjuntos de base. Pode ser mais fácil enxergar o produto cartesiano na forma de linhas e colunas:

A×BAnaBeatrizCarla
Daniel
Edson
Fábio

Pode-se construir o produto cartesiano de um conjunto com ele mesmo (A×A).

Relação

Uma relação é exatamente o que o nome diz: estabelece uma relação entre dois conjuntos, na forma de pares ordenados. Uma relação é um subconjunto do produto cartesiano.

A = {Ana, Beatriz, Carla}
B = {Daniel, Edson, Fábio}
A r B = {(Ana, Edson), (Ana, Fábio), (Carla, Fábio)}

Note que há elementos 'solteiros' em ambos os conjuntos; isto é permitido numa relação.

A r BAnaBeatrizCarla
Daniel
Edson
Fábio

É possível construir a relação inversa, que será um subconjunto do produto cartesiano B×A. Basta inverter os itens dos pares ordenados, ou trocar linhas por colunas na tabela. Supondo que a relação acima signifique "A ama B", a relação inversa significaria "B é amado por A".

Uma relação total é aquela onde todos os elementos do conjunto A estão relacionados a pelo menos um elemento do contradomínio (o conjunto B). A relação do exemplo acima não é total, devido a 'Beatriz'.

Função parcial

Função parcial é uma relação em que cada elemento do conjunto A está relacionado a no máximo um elemento do conjunto B.

A relação do exemplo anterior não era uma função parcial por conta das duas relações de 'Ana'. O exemplo modificado a seguir é uma função parcial:

A r BAnaBeatrizCarla
Daniel
Edson
Fábio

Porém, a relação inversa ao exemplo acima não poderia ser uma função parcial, por conta de 'Fábio'.

Função total ou função

Uma relação é uma função total, ou simplesmente uma função, quando todos os elementos do conjunto A estão relacionados a um e apenas um elemento do conjunto B.

O exemplo anterior não era uma função total, mas o seguinte é:

f(A)AnaBeatrizCarla
Daniel
Edson
Fábio

Uma função é injetora quando cada elemento do conjunto B está relacionado a, no máximo, um elemento do conjunto A. O inverso de uma função injetora é, no mínimo, uma função parcial.

O exemplo a seguir é uma função injetora:

f(A)AnaBeatrizCarla
Daniel
Edson
Fábio
Geraldo

Uma função é sobrejetora quando cada elemento do conjunto B está relacionado a pelo menos um elemento do conjunto A. O inverso de uma função sobrejetora é, no mínimo, uma relação total. Exemplo:

f(A)AnaBeatrizCarlaJanine
Daniel
Edson
Fábio

E finalmente temos a função bijetora, injetora e sobrejetora ao mesmo tempo. O inverso de uma função bijetora é outra função bijetora. Exemplo:

f(A)AnaBeatrizCarla
Daniel
Edson
Fábio

Numa função bijetora, os conjuntos A e B têm de ter a mesma cardinalidade. No caso de conjuntos finitos, como nos exemplos acima, os dois têm de ter o mesmo número de elementos.

No caso dos conjuntos infinitos, os naturais (N), inteiros (Z) e racionais (Q) possuem a mesma cardinalidade, então pode haver funções bijetoras entre eles. Porém não pode haver entre e.g. naturais e reais (R) pois a cardinalidade de R é maior.

Operações unárias e binárias

Pode haver relações, e funções, entre os elementos de um mesmo conjunto. No exemplo abaixo, temos um novo conjunto A com seis elementos, e uma função bijetora cujo contradomínio é ele mesmo.

f(A) AnaBeatrizCarlaDanielEdsonFábio
Ana
Beatriz
Carla
Daniel
Edson
Fábio

Esta é uma função unária, pois admite um parâmetro. Por exemplo, f('Beatriz') é igual a 'Ana'.

Na aritmética temos diversas operações unárias, e.g. o negativo de um número (-x). Mas, quando pensamos em aritmética, lembramos antes das operações binárias (a+b, a×b).

Uma função binária é uma relação entre um produto cartesiano e um conjunto. O produto cartesiano contém todas as possíveis combinações dos dois parâmetros, e o conjunto possui os resultados.

Novamente, é mais fácil enxergar isso numa tabela.

f(a,b) AnaBeatrizCarla
Ana CarlaCarlaBeatriz
Beatriz CarlaAna
Carla BeatrizEdson(ninguém)

A tabela acima, que descreve uma operação binária, é conhecida por Tabela de Cayley. f('Ana','Beatriz') ou 'Ana'+'Beatriz' resulta em 'Carla'.

Para colorir o exemplo, podemos imaginar que a operação significa "falar mal de". Por exemplo, quando Ana e Beatriz se juntam, falam mal de Carla. Quando Beatriz está sozinha, rumina sobre Ana, porém Carla não maldiz ninguém quando isolada.

Do jeito que está, a operação acima tem dois defeitos: não é fechada nem está bem-definida. Não é fechada porque dois resultados ('Edson' e 'ninguém') não pertencem ao conjunto de suporte. Tampouco é bem-definida porque há uma célula sem resultado nenhum.

O exemplo a seguir foi devidamente consertado, pela introdução do elemento "ninguém", representado por "--" por brevidade:

a+b --AnaBeatrizCarla
-- --CarlaAna--
Ana CarlaCarlaCarlaBeatriz
Beatriz AnaCarlaAna--
Carla --Beatriz----

Note que, do jeito que definimos a operação acima, Ana+Ana tem o mesmo resultado que Ana+ninguém, pois imaginamos ser equivalente estar na companhia de ninguém ou de si mesmo...

Também fizemos a operação comutativa: Carla+Beatriz e Beatriz+Carla têm o mesmo resultado. Mas poderíamos ter definido a operação como não-comutativa, postulando e.g. que se Beatriz vai à casa de Carla, a fofoca é uma, e se Carla vai à Beatriz, é outra.

Magma ou grupóide

O último exemplo encaixa-se na definição de magma ou grupóide: uma operação binária bem-definida e fechada. Não se impõe nenhum outro requisito sobre ela. É a estrutura algébrica digna deste nome mais básica que existe.

Podemos perceber que, como está, a operação do último exemplo não é associativa. Por exemplo, Ana+Ana+Carla dá um resultado diferente conforme começamos por um lado ou por outro: (Ana+Ana)+Carla=Carla+Carla=ninguém, enquanto Ana+(Ana+Carla)=Ana+Beatriz=Carla.

Um exemplo de grupóide no contexto da aritmética é a subtração de números inteiros (Z,-), pois a subtração não é associativa. Exemplo: (5-3)-2=0 enquanto 5-(3-2)=1. A subtração de números naturais (N,-) não é sequer um grupóide, pois algumas subtrações resultariam em números negativos que não estão no conjunto de suporte N.

O produto vetorial é outro exemplo de operação matemática não-associativa.

Não interessa muito o símbolo que usamos para a operação algébrica do magma, pois ela pode ser literalmente qualquer coisa. A literatura usa o operador a*b (asterisco) quando quer frisar que a operação não tem relação com a aritmética comum.

Porém, a convenção é usar o símbolo da soma (a+b) quando a operação é comutativa, ou quando ela é comparável à adição. E usa-se a notação de multiplicação (a.b ou ab) quando se trata de operação não-comutativa, ou quando ela é análoga à multiplicação.

Quase-grupo

Classificar a subtração de inteiros como um simples magma é injusto, pois a operação possui estrutura e simetria. Por exemplo, 5-2=3 e 5-3=2. Generalizando: se a-b=c, então a-c=b (a simetria oculta é a operação de adição comutativa: a=b+c).

Algo semelhante aconteceria com um magma de divisão. Magmas com esse tipo de estrutura são denominados quase-grupos.

Um quase-grupo com elemento neutro é denominado loop; e um loop com elemento inverso é denominado grupo. Esta seqüência de estruturas algébricas de estrutura crescente não é muito citada na literatura. É mais comum começar estendendo o magma com a estrutura de associatividade, que nos leva ao...

Semigrupo

Semigrupo é um magma cuja operação é associativa. Numa operação associativa, podemos escrever a*b*c sem parênteses, pois tanto faz qual operação realizamos primeiro.

Vamos consertar a tabela do exemplo lá de cima, a fim de torná-la um semigrupo.

a+b --AnaBeatrizCarla
-- --------
Ana ----CarlaBeatriz
Beatriz --Carla----
Carla --Beatriz----

Salvo engano, a operação tal qual definida acima é associativa, e facilmente dá um resultado nulo.

O algoritmo ingênuo/óbvio para verificar a associatividade de uma tabela de Cayley é testar se cada trinca a*b*c é associativa. Para um conjunto-base de 4 elementos, temos de testar 64 trincas. Um algoritmo mais eficiente é o teste de associatividade de Light.

No dia-a-dia, estamos muito mais acostumados com operações associativas, tipo soma e multiplicação. A multiplicação de matrizes quadradas também é associativa, ainda que não seja comutativa.

Monóide

Um monóide é um semigrupo que possui o elemento neutro ou 'identidade'. Supondo que a identidade seja "e", então e*a=a*e=a. Só pode existir um elemento identidade.

Quando o monóide é não-comutativo, tende a adotar a notação de multiplicação, chamar o elemento neutro de "identidade" (invocando o número 1 que é o elemento neutro da multiplicação). A literatura usa o símbolo "e" (mais comum) ou o número 1 para a identidade.

Quando o monóide é comutativo, tende a adotar a notação de soma, é preferível chamar o elemento neutro de elemento neutro em vez de identidade, e costuma-se usar o número zero como símbolo do elemento neutro, numa metáfora com a aritmética comum.

Lembrando que o zero também é especial na multiplicação, mas por ser absorvente. Elemento absorvente é aquele que absorve ou "aniquila" qualquer outro que se combina com ele. Na álgebra booleana, V (verdadeiro) é o elemento absorvente da operação "ou": a-ou-V sempre resulta V, independente do valor de "a".

Como era de se esperar, adição e multiplicação de números naturais são monóides, pois são operações associativas e têm elementos neutros (0 e 1, respectivamente). A aritmética modular também forma monóides sob adição e sob multiplicação.

Vamos consertar novamente nossa tabela para que ela tenha um elemento neutro funcional, e vamos continuar usando o traço duplo '--', que significa 'ninguém', como a identidade:

a+b --AnaBeatrizCarla
-- --AnaBeatrizCarla
Ana Ana--CarlaBeatriz
Beatriz BeatrizCarla--Ana
Carla CarlaBeatrizAna--

Salvo engano, a operação acima cumpre os requisitos. Conforme a operação tem mais e mais estrutura interna, vai diminuindo a liberdade de atribuir resultados a cada célula.

Grupo

Finalmente chegamos no grupo, que é a mais importante e mais estudada estrutura algébrica. Um grupo é um monóide onde cada elemento possui inverso, ou seja, a*b=b*a=e. Cada elemento de um grupo possui um e apenas um inverso.

A presença do inverso permite definir as operações de subtração e divisão de forma subsidiária. Por exemplo, a-b é definido como a+(-b). Não precisamos mais definir a subtração como operação binária, já que adicionar o inverso supre a necessidade.

Vamos rever o monóide das fofoqueiras, que por acaso também é um grupo:

a+b --AnaBeatrizCarla
-- --AnaBeatrizCarla
Ana Ana--CarlaBeatriz
Beatriz BeatrizCarla--Ana
Carla CarlaBeatrizAna--

Este grupo é comutativo (um grupo comutativo também é chamado de abeliano). Não teria sido possível fazê-lo não-comutativo, pois o menor grupo não-abeliano tem seis elementos. O inverso de cada elemento é ele mesmo, de modo que Ana+Ana=nulo, Beatriz+Beatriz=nulo e Carla+Carla=nulo.

Este grupo é isomórfico a V4, formado pelas posições de um retângulo que pode ser virado horizontal e verticalmente.

+------------+
| 1        2 |    posição inicial = e
| 3        4 |    (identidade)
+------------+

+------------+
| 3        4 |    virado verticalmente = v
| 1        2 |    
+------------+

+------------+
| 2        1 |    virado horizontalmente = h
| 4        3 |    
+------------+

+------------+
| 4        3 |    virado em ambos eixos = hv
| 2        1 |    
+------------+

Os símbolos e, h, v e hv descrevem os movimentos do retângulo, e também descrevem o estado atual do retângulo. Por exemplo, se partimos do retângulo h e aplicamos o movimento h, obtemos o retângulo e. A tabela de Cayley abaixo descreve todas as possibilidades:

a.b ehvhv
e ehvhv
h hehvv
v vhveh
hv hvvhe

Veja que, se substituirmos Ana por 'h', Beatriz por 'v' e Carla por 'hv', constatamos que a tabela é exatamente a mesma. Só que aquela foi feita no chute, e esta representa a rotação de um objeto real. Ainda assim, ficaram iguais.

Nas rotações do retângulo, temos uma justificativa concreta do porquê cada elemento ser o inverso dele mesmo. É óbvio que virar um retângulo duas vezes (ou um número par de vezes) num mesmo eixo volta para a posição original.

Mas podemos tentar formar o grupo das fofoqueiras de outro jeito:

a+b --AnaBeatrizCarla
-- --AnaBeatrizCarla
Ana AnaBeatrizCarla--
Beatriz BeatrizCarla--Ana
Carla Carla--AnaBeatriz

Nesta versão, o inverso de Ana é Carla e vice-versa. Como só há três elementos não-neutros, Beatriz teve de continuar sendo o inverso de si mesma.

Agora, observe o seguinte grupo, que é a adição módulo 4, também conhecido como Z4:

a+b 0123
0 0 1 23
1 1 2 30
2 2 3 01
3 3 0 12

As tabelas são exatamente iguais (isomórficas) se considerarmos que Ana=1, Beatriz=2 e Carla=3. Apesar desta última tabela de Cayley ter respaldo aritmético, e a outra ter sido feita no chute, acabaram iguais.

A verdade é que não existem muitas formas de organizar um grupo, e menos ainda quando é um grupo pequeno. Um grupo de 4 elementos vai ser forçosamente isomórfico a Z4 ou a V4.

Adição de números inteiros é um grupo (infinito), pois todo número tem um inverso (e.g. 2 e -2). Já a adição de naturais não é um grupo, é apenas um monóide, pela ausência dos números negativos.

Multiplicação de inteiros não é um grupo. Multiplicação de racionais, ou reais, é um grupo, desde que o zero fique de fora.

Em se tratando de aritmética modular, qualquer conjunto finito de inteiros é um grupo comutativo sob adição. Basta pensar na "aritmética dos ponteiros do relógio": 5+7=0, 6+6=0, etc. Porém não é um grupo sob multiplicação (é apenas um monóide) pois o zero não tem inverso.

É possível formar um grupo sob multiplicação com aritmética modular, se excluírmos o zero e os números que não forem relativamente primos ao módulo. Por exemplo, em aritmética módulo 6, sobram apenas os elementos 1 e 5. Em aritmética módulo 7, sobram todos os positivos: 1,2,3,4,5,6.

A multiplicação de matrizes quadradas forma um grupo não-comutativo.

Grupo comutativo ou abeliano

Os grupos comutativos são denominados abelianos. São mais simples que os não-comutativos, porém são muito importantes, já que a aritmética que usamos diariamente é comutativa.

Os grupos muito pequenos, de ordem 5 (com 5 elementos) ou menor, são todos comutativos. O menor grupo não-comutativo tem 6 elementos. Todo grupo de ordem prima é abeliano.

Grupo cíclico

Grupo cíclico é aquele onde podemos gerar todos os elementos a partir de um só. O grupo dos inteiros sob adição é cíclico pois, fazendo 0+1, 0+1+1, 0+1+1+1 etc. conseguimos chegar em qualquer valor.

(Para atingir os números negativos, usamos o gerador inverso -1, mas ainda consideramos Z como cíclico pois os dois geradores essenciais +1 e -1 são inversos um do outro.)

Todo grupo cíclico é abeliano, porém há grupos comutativos não-cíclicos. Dentre os grupos de 4 elementos, V4 é não-cíclico, enquanto Z4 é cíclico. Os grupos cíclicos de ordem prima (ou seja, cujo número de elementos é um número primo) são especiais, por diversos motivos. Todo grupo primo é cíclico, mas existem grupos cíclicos de todas as ordens (Zn onde "n" é qualquer número).

Os chamados grupos-p são aqueles cuja ordem é a potência de um primo, e também têm posição relevante na teoria dos grupos. Obviamente, todo grupo primo também é um grupo-p de ordem p1. Nem todo grupo-p é cíclico (e.g. V4) e nem todo grupo-p é abeliano (e.g. grupo dos quaternions, ordem 8). (Trivia: todo grupo-p2 é abeliano.)

Todo grupo abeliano que não seja um grupo-p, é equivalente a uma combinação de grupos-p cíclicos. Um grupo abeliano de ordem 20 pode ser isomórfico a Z5×Z4 ou a Z5×Z2×Z2. Já um grupo abeliano de ordem 10 é obrigatoriamente isomórfico a Z5×Z2.

Para que um grupo não-p abeliano seja cíclico, as ordens dos grupos-p cíclicos que o compõem devem ser relativamente primas entre si. Um grupo abeliano de ordem 10 sempre será cíclico, pois sempre é 5x2, e 5 é relativamente primo a 2. Um grupo abeliano de ordem 20 é cíclico se 5x4 (pois 5 é relativamente primo a 4) e não-cíclico se 5x2x2 (pois o 2 se repete).

Normalmente, quando pensamos em grupo cíclico, imaginamos logo um grupo de adição modular, talvez porque basta imaginar um relógio para ter uma ideia de como ele funciona. Mas podemos criar um grupo cíclico com a operação de multiplicação usando números complexos.

Por exemplo, ei.2π/5 é uma raiz quinta primitiva de 1. Ou seja, esse é um dos cinco números que, se elevado à quinta potência, resulta em 1. Elevar esse número ao quadrado, ao cubo, etc. gera as outras raízes primitivas, formando uma seqüência cíclica ei.4π/5, ei.6π/5, ei.8π/5, ei.10π/5=ei.2π=1, ei.2π/5, ei.4π/5...

As operações multiplicativas com estes elementos formam um grupo que é isomórfico ao grupo de adição módulo 5. Essa "mágica" acontece porque multiplicar potências de mesma base equivale a somar os expoentes, e porque expoentes imaginários formam um ciclo ou espiral.

Ordem de um elemento do grupo

A ordem de um elemento de um grupo é o número de elementos do grupo que podem ser "atingidos" ou gerados, pela aplicação repetida da operação do grupo.

Foi dito que, num grupo cíclico, podemos gerar todos os elementos a partir de um só, pela soma ou multiplicação repetida. Dizendo isso com mais rigor matemático: um grupo cíclico tem um gerador de ordem igual à ordem do grupo inteiro.

A ordem do elemento neutro é sempre 1. Por exemplo, a adição repetida de 0 ou a multiplicação repetida de 1 nunca produz outra coisa que não o elemento neutro.

Uma conseqüência do teorema de Lagrange para subgrupos, é que a ordem de cada elemento divide a ordem do grupo. Por exemplo, não pode haver um elemento de ordem 4 num grupo de 25 elementos. Outro corolário é que, num grupo de ordem prima, todos os elementos têm a ordem do grupo (exceto o neutro).

As ordens dos elementos geradores descrevem o caráter de um grupo. Por exemplo, sabemos que V4 e Z4 são fundamentalmente diferentes apesar de ambos serem abelianos e de ordem 4, porque Z4 possui dois geradores de ordem quatro (1 e 3) enquanto V4 possui dois geradores de ordem dois. Se fossem isomórficos, haveria uma relação 1:1 entre as ordens dos geradores de um e de outro.

Geradores de um grupo

Em qualquer grupo, podemos achar um pequeno número de elementos geradores. Através de operações repetidas com os geradores, conseguimos atingir todos os demais elementos.

Como já foi mencionado, os grupos cíclicos precisam de apenas um gerador.

Subgrupo

Um subgrupo é um recorte do grupo-base que ainda funciona perfeitamente como um grupo.

Todo grupo tem pelo menos um subgrupo trivial, que contém apenas o elemento identidade. Também se considera que todo grupo é um subgrupo de si mesmo. Claro que os subgrupos próprios, menores que o original porém maiores que o trivial, é que são os realmente interessantes.

Imagine o grupo de adição módulo 6, cujo conjunto de suporte é {0,1,2,3,4,5}. Dentro dele, existem dois subgrupos próprios: o subgrupo {0,2,4} e o subgrupo {0,3} (note que 3+3=0 mod 6). Como estes subgrupos têm ordem prima, eles não têm subsubgrupos próprios.

Teorema de Lagrange: a ordem de um subgrupo sempre divide a ordem do grupo.

Teorema de Cauchy: se um número primo "p" divide a ordem do grupo, existe um subgrupo de ordem "p" e um elemento de ordem "p".

Grupo de permutação

Nos primórdios da álgebra abstrata, os matemáticos concentravam-se num único tipo de grupo, o de permutação de "n" elementos, cuja ordem será de "n!". Por exemplo, existem 6 permutações de 3 elementos: 123, 312, 231, 132, 213 e 321.

A literatura adota uma sintaxe de permutações. Por exemplo, (12) significa que o 1º elemento vai para a 2º posição, e o 2º elemento "faz a volta" e vai para a 1º posição. Os números entre parênteses formam um ciclo. Qualquer permutação com apenas um número é nula, pois diz que o elemento vai para o lugar onde já está. A permutação (12)(34) troca 1 com 2, e 3 com 4 — são dois ciclos disjuntos, um não interage com o outro, e neste caso são comutativos.

Os ciclos que interferem podem não ser comutativos, mas podem ser combinados, e.g. (12)(23) é igual a (321). Já (12)(12) anula a si mesmo e resulta em (1). Um exemplo de não-comutatividade: (12)(23)=(321) porém (23)(12)=(123). Existem macetes para calcular estas combinações diretamente, mas eu prefiro pensar em um conjunto de letras (ABC) e checar empiricamente a ação do grupo sobre esse conjunto, por exemplo ABC operado por (123) vira CAB.

O conjunto de todas as permutações possíveis forma um grupo. A sintaxe de permutação não representa apenas as operações, mas também o estado final, como foi o caso do retângulo do grupo V4.

O grupo da permutação de 3 elementos é o S3, de ordem 6. Ele é muito presente na didática por ser o menor grupo não-comutativo ou não-abeliano. Seus elementos são (1)=identidade, (12), (23), (13), (123), (321).

Este grupo tem diversos subgrupos abelianos. De particular importância é o subgrupo das rotações [(1), (123), (321)], que é "normal", qualidade de que falarei brevemente um pouco adiante.

A importância dos grupos de permutação é resumida pelo teorema de Cayley: todo grupo é isomórfico a algum subgrupo de permutações. Por exemplo, o subgrupo das rotações de S3 tem a mesma estrutura do grupo Z3 (adição módulo 3); os grupos V4 e Z4 são pequenos subgrupos de S4, e assim por diante.

Qualquer grupo de permutação pode ser gerado por apenas dois elementos: uma rotação e.g. (12...n) e uma transposição de elementos adjacentes e.g. (12). Mas isso pode não ser verdade para um subgrupo.

Grupo diedral

Um grupo diedral representa as rotações e viradas, reflexões ou espelhamentos ("flips") de uma figura geométrica regular plana. Por exemplo, suponha um triângulo, que pode ser girado ou refletido, desde que fique de ponta para cima. Ele pode assumir seis posições:

   1        2        3        1        3        2
 3   2    1   3    2   1    2   3    1   2    3   1

   e        r       r.r       f       f.r      r.f ou
                                               f.r.r

Tomei a liberdade de definir o primeiro triângulo como sendo a identidade (e), atribuí o símbolo "f" para o ato de virar o triângulo pela ponta de cima (ou refleti-lo num espelho vertical), e "r" para a rotação.

Em vez de atribuir símbolos especiais para o ato de virar pelas pontas esquerda ou direita, preferimos economizar na simbologia, expressando os demais elementos pela composição dos dois geradores "r" e "f". Por exemplo, f.r equivale a virar pela ponta direita.

Note que, fiel ao teorema de Lagrange, a ordem de "r" é 3, enquanto a ordem de "f" é 2, e ambos dividem 6 que é a ordem do grupo.

Semelhante ao que acontece com o grupo de permutações, algumas operações não são comutativas. Por exemplo, f.r (virar e rotacionar em seguida) causa um resultado diferente de r.f (rotacionar e depois virar). Por outro lado, as rotações formam um subgrupo comutativo.

Outras observações interessantes: a rotação dupla r2 equivale à rotação simples no sentido inverso r-1; virar duas vezes (f2) é o mesmo que nada.

Por coincidência, o grupo diedral D3 é isomórfico ao grupo de permutações S3. Isto não acontece em grupos maiores.

Subgrupo normal

Ainda sobre o "grupo do triângulo" D3, podemos identificar três subgrupos próprios dentro dele, todos abelianos:

Apenas o primeiro subgrupo é normal. Um subgrupo é normal, ou não, conforme o relacionamento que ele tem com os elementos que ficaram de fora.

Por exemplo, suponha que multipliquemos cada elemento do subgrupo de rotações por "f", pela esquerda:

f.{e, r, r2} = {f, f.r, f.r.r} = {f, f.r, r.f}

Agora, pela direita:

{e, r, r2}.f = {f, r.f, r.r.f} = {f, r.f, f.r}

Apesar da operação "f" não ser comutativa, multiplicar o subgrupo das rotações por "f" por um lado ou por outro produziu o mesmo resultado. E se multiplicássemos por f.r ou r.f, pela esquerda ou pela direita, também produziria o mesmo resultado. Isto é o que caracteriza o subgrupo das rotações como normal.

(Ok, os elementos de cada conjunto-resultado podem aparecer numa ordem diferente, mas isto não muda nada; lembre-se que, na teoria dos conjuntos, {1,2,3} é igual a {3,2,1}.)

Nem precisamos testar a multiplicação por f.r e r.f para conferir se o subgrupo é normal, pois o grupo só possui dois geradores: r e f. O gerador r está no subgrupo normal, então basta fazer o teste com o gerador que sobrou.

Os conjuntos gerados por esta multiplicação não são grupos; são chamados de "cosets" na literatura em inglês; são compostos justamente pela "escória" dos elementos, aqueles que não pertencem ao subgrupo.

Agora, vamos testar a normalidade do subgrupo {e, f}:

r.{e, f} = {r, r.f}
{e, f}.r = {r, f.r}

Multiplicar o subgrupo por "r" pela esquerda e pela direita entregou resultados distintos (pois r.f e f.r são diferentes). Portanto, o subgrupo {e,f} não é normal.

Subgrupos de um grupo comutativo, quando existem, são sempre normais. Por outro lado, grupos que não possuem nenhum subgrupo normal são denominados grupos simples. Eles são os grupos mais fundamentais, são os "átomos" que se combinam para formar os grupos maiores. Os grupos de ordem prima são simples e abelianos, mas também há grupos simples não-abelianos.

A série normal de um grupo é uma cadeia de subgrupos normais, cada vez menores, até chegar no grupo trivial {e} ou 1. O subgrupo imediatamente antes do trivial será simples.

O símbolo de subgrupo normal é um triângulo. G⊲H ou H⊳G significa que G é subgrupo normal de H.

Quocientes e produtos de grupos

Assim como um grupo pode ser subgrupos normais, um grupo pode ser construído a partir da combinação ou cruzamento de grupos menores.

O produto direto P=A×B implica que tanto A quanto B serão subgrupos normais do supergrupo resultante, ou seja, A⊲P e B⊲P. Um exemplo de produto direto é Z3={0,2,4} por Z2={0,1} resultando em Z6={0,1,2,3,4,5}.

O produto direto de dois grupos abelianos também será abeliano. Neste caso a operação também pode ser chamada de soma abeliana.

Supondo dois grupos sem elementos em comum exceto pela identidade, o produto direto pode ser representado por tuplas. Ou seja, cada elemento de A×B pode ser representado por (a,b), mantendo "a" e "b" separados, e a combinação de dois elementos satisfaz a equação

(a, b) * (a', b') = (a * a', b * b')

Em particular, a equação acima significa que

(a, 1) * (1, b) = (1, b) * (a, 1) = (a, b)

ou seja, a operação de elemento de A com elemento de B é comutativa, mesmo que os grupos A e B não sejam eles mesmos comutativos. Se aB=Ba e bA=Ab, tanto A quanto B são subgrupos normais de P.

O produto semidireto P=A⋉B implica que pelo menos B será subgrupo normal de P. Note que o símbolo é a mistura de × e ⊳. Em algumas literaturas, o triângulo aponta para o subgrupo normal (é a convenção que adotamos acima). Em outras, a convenção é oposta: o triângulo fica do lado do subgrupo normal.

Um exemplo de produto semidireto é {e,f} por {e,r,r2} formando S3. Apesar de ambos os subgrupos serem abelianos, o supergrupo não é abeliano, e apenas o segundo é o subgrupo normal.

No produto semidireto, a operação entre elementos não-neutros de A e de B não pode ser comutativa, do contrário, seria equivalente ao produto direto. Então,

(a, 1) * (1, b) ≠ (1, b) * (a, 1)
a.b ≠ b.a

Vamos supor que exista b' dentro do grupo B, tal que b.a=a.b'. Isto nos permitiria mapear o valor b.a com alguma tupla (a,b'). Manipulando essa igualdade,

a.b'=b.a
a.b'.a-1 = b.a.a-1
a.b'.a-1 = b
b = a.b'.a-1
b' = a-1.b.a

A fórmula acima é justamente a fórmula de conjugação de grupo. Subgrupos normais são invariáveis sob conjugação. Uma vez que B é presumido subgrupo normal do produto semidireto, b' existe.

A conjugação de um (elemento de) subgrupo normal é um automorfismo desse grupo, portanto podemos reescrever a fórmula como

b.a = a.b' = a.Aut[a](b)

Para elementos na forma b.a, o valor de "a" comanda um automorfismo sobre "b". Já para elementos na forma a.b, temos presumido que o automorfismo é a identidade (b permanece o mesmo). Expressando em tuplas, temos

(a, 1)(1, b) = (a, b)

Se b não é modificado, isto significa que o elemento do grupo A que comanda o automorfismo tem de ser a identidade, e portanto o automorfismo tem de ser comandado pela tupla da direita (1,b) pois só ali encontramos a identidade advinda do grupo A.

Finalmente, combinando todos esses achados, temos a fórmula geral de operação de tuplas para o produto semidireto:

(a, b)(a', b') = a.b.a'.b'
= a(b.a')b'
= a.(a'.Aut[a'](b)).b'
= (a * a', Aut[a'](b) * .b')

O detalhe crucial é que o valor a' da segunda tupla comanda um automorfismo sobre o valor de "b" da primeira tupla.

Para definir um produto semidireto, não basta definir os grupos e qual deles será normal do resultado. Também é preciso escolher o automorfismo.

O produto direto é apenas um caso especial do produto semidireto onde o único automorfismo possível é a identidade, o que permite elidi-lo das fórmulas acima, e podemos constatar que elas tornam-se iguais às respectivas fórmulas de produto direto.

No caso do grupo triangular S3, para que ele possa ser expresso como um produto semidireto de {e,f} por {e,r,r2}, precisamos estabelecer que f.r seja diferente de r.f. Para atingir este resultado, definimos que Aut[f](r)=r2, de modo que f.r=r2f.

Quando G⊲H, podemos definir o quociente de grupo Q=H/G. Q será o grupo formado pelos cosets do subgrupo normal H, ou seja, cada elemento "q" de Q opera sobre H e seus cosets. (Quando G não é normal, H/G é simplesmente chamado de índice, pois também particiona H em cosets mas eles não formam um grupo.)

Um exemplo já foi mostrado antes: em relação ao grupo S3={e,f,r,fr,rf,r2}, o subgrupo normal C3={e,r,r2} apresenta dois cosets: ele mesmo, e {f,rf,fr}. O grupo que transforma um coset em outro é isomórfico a S2, e é simplesmente {e,f}.

O quociente G/1, ou seja, um grupo qualquer pelo grupo trivial, será sempre isomórfico a G, portanto considera-se G/1=G. Analogamente, G/G=1, porque todo grupo é um subgrupo normal de si mesmo, embora não seja um subgrupo próprio.

Quando G⊲H e Q=H/G, observe que nem sempre é válido que H=Q⋉G para algum Q. Por exemplo, Z4/Z2=Z2, porém Z2×Z2 não é Z4. Nem tampouco há produto semidireto envolvendo Z2 que resulte em Z4.

Grupos como Z4 em que a operação quociente não é reversível são denominados inseparáveis. Todo grupo simples é inseparável; essa nomenclatura é mais útil para grupos não-simples, e.g. os grupos-pn (n≥2) cíclicos como o supracitado Z4, Z8, Z9, etc.

Observe ainda que V4/Z2=Z2 e Z2×Z2=V4. Portanto, o grupo V4 é separável. Constatamos que o quociente de grupo é uma operação que pode "destruir" informação, visto que dados os mesmos divisor Z2 e quociente Z2, há pelo menos dois dividendos possíveis.

Um grupo é denominado solúvel quando cada quociente entre grupos adjacentes da sua série normal é um grupo cíclico. Essa definição é relevante no contexto da prova da inexistência de fórmula fechada para resolver equações de quinto grau ou acima.

Por exemplo, S3 é solúvel pois S3/C3=S2 (cíclico), e S2/1=S2 (também cíclico). Por outro lado, S5 não é solúvel pois sua série normal termina em A5 e 1, e A5 é um grupo simples, não-abeliano e não-cíclico.

Campo de Galois

Um campo é uma estrutura algébrica onde convivem dois grupos abelianos, que operam sobre um mesmo conjunto de suporte. Temos duas operações: a#b e a*b, em que a segunda operação é distributiva segundo a regra:

(a#b)*c = (a*c)#(b*c)

O elemento neutro da primeira operação fica fora do grupo da segunda operação; ele tem de ser tratado de forma especial, pois pela distributividade, esse elemento "aniquila" a segunda operação:

(a#0)*c = (a*c)#(0*c) = a*c

e como este aniquilamento não pode ser desfeito por um elemento inverso, não cabe na definição de grupo.

Se isto parece confuso, basta ver que os números racionais (Q), reais (R) e complexos (C) são todos campos, pois são grupos comutativos simultaneamente sob adição e multiplicação, e obviamente a multiplicação é distributiva:

(2+3)x7 = (2x7)+(3x7) = 5x7 = 35
(2+0)x7 = (2x7)+(0x7) = 2x7 = 14

Os números racionais, reais, etc. são conjuntos infinitos. É possível criar campos que operam em aritmética modular, mediante certas condições. Por exemplo, a aritmética dos ponteiros do relógio não é um campo pois 12 não é primo. O módulo tem de ser primo, ou potência de um primo, para que forme um campo.

"Campo" e "campo de Galois" são a mesma coisa. Alguns textos preferem a última forma em homenagem ao matemático Évariste Galois, que fundou a teoria dos grupos e campos.

Anel

Como vimos, um campo é formado pela coexistência de dois grupos abelianos. Se combinarmos um grupo e um monóide, ou dois monóides, ou dois magmas, etc. obtemos outras estruturas algébricas.

O anel é a composição de um grupo comutativo e um monóide, sendo que a operação do monóide é distributiva sobre a do grupo. O monóide não precisa ser comutativo. (Lembrando que a única diferença de monóide para grupo é a falta do elemento inverso.)

A aritmética dos ponteiros do relógio é um anel, pois módulo 12 é um grupo sob adição e um monóide sob multiplicação.

Para ser honesto, a definição exata de anel varia de acordo com o material. Alguns compêndios definem o anel de forma mais relaxada, admitindo um semigrupo na segunda operação, reservando o nome "anel com unidade" para aqueles dotados de monóides.

Anéis bem- ou mal-comportados

Os anéis podem ser mais ou menos "comportados", no sentido que suas operações se comportam da forma que estamos acostumados na aritmética convencional, ou não.

A aritmética dos ponteiros do relógio é mal-comportada, porque 2.6=0, 3.4=0, etc. Esses elementos anômalos são os "divisores de zero", pois conduzem à conclusão bizarra que 0 pode ser fatorado como 22.3.

Lembra da propriedade do cancelamento, do ensino fundamental? Se 8x=8y, então x=y. Pois é, mas isto não vale no relógio: 8.6=8.3, porém 6 não é igual a 3. Isto também é culpa dos famigerados "divisores de zero".

Por outro lado, o anel dos inteiros (de ordem infinita) é um exemplo de bom comportamento. Um anel de ordem prima também é comportado, não possui "divisores de zero" — na verdade, todo anel de ordem prima também é um campo.

Os anéis que não possuem "divisores de zero" são denominados domínios integrais.

Entre os domínios integrais e os campos, existem outras gradações de "bom comportamento", conforme o anel suporta conceitos equivalentes a:

Note que nada disso significa que os anéis "mal-comportados" sejam inúteis. São simplesmente anéis que desviam do usual da aritmética. Por exemplo, o fato de 2 e 3 serem "divisores de zero" na aritmética do relógio nos diz que um compromisso recorrente da sua agenda, cujo intervalo de horas seja um múltiplo de 2 ou de 3, vai acabar caindo sempre nos mesmos horários. Já um compromisso recorrente a cada 5 horas vai ficar todo espalhado na sua agenda.

Ideal

Um "ideal" de um anel é análogo a um subgrupo ou um subcampo. A propriedade especial do ideal é: ao multiplicar qualquer elemento do ideal por qualquer elemento do anel, o resultado ainda pertence ao ideal.

Se o anel não for comutativo, haverá ideais esquerdos e direitos, que podem ou não ser iguais. No caso de anéis comutativos, o ideal é sempre ambidestro.

Um exemplo simples de ideal é 2Z em relação a Z, ou seja, os inteiros pares como ideal do anel de inteiros. É fácil constatar que a multiplicação de qualquer número par por qualquer inteiro apresenta resultado par, que pertence ao ideal.

Note que 2Z não possui a identidade multiplicativa (1). Portanto, apesar de ser o ideal de um anel, 2Z não é por si mesmo um anel (logo abaixo veremos que ele é um pseudo-anel).

Assim como todo grupo é considerado subgrupo de si mesmo, todo anel tem um ideal composto por todos os elementos do anel. Se o ideal possui o "1", ou seja, a identidade multiplicativa, ele obrigatoriamente contém o anel inteiro.

Semianel ou "Rig"

O semianel é a composição de dois monóides, ou seja, "grupos" sem os elementos inversos, a segunda operação distribuindo sobre a primeira.

Por exemplo, o conjunto dos naturais N forma um semianel sob adição e multiplicação, pois são operações associativas, distributivas, comutativas, e possuem cada qual seu elemento neutro. Só não possuem os elementos inversos, que seriam os números negativos e recíprocos, respectivamente.

O nome "rig", usado na literatura em inglês, indica um "ring" sem a letra "n", ou seja, sem os números negativos.

"Rng"

O pseudo-anel, ou "rng" na literatura em inglês, é composto por um grupo comutativo e um semigrupo, a segunda operação distribuindo sobre a primeira. A falta da letra "i" indica que a segunda operação não tem a identidade, ou seja, o elemento neutro.

Por exemplo, o conjunto dos inteiros pares (2Z) é um pseudo-anel. É um grupo comutativo sob adição (pois adicionar dois pares sempre resulta par) e um semigrupo sob multiplicação (não há o elemento neutro 1, porém multiplicar dois pares sempre resulta par). A distribuição também funciona como de costume.

Como dito antes, alguns materiais adotam esta mesma definição (grupo+semigrupo) para "anel".

Reticulado

Um reticulado é vagamente parecido com um anel. É composto por dois semigrupos comutativos. A principal distinção do reticulado é a propriedade da absorção, como segue:

a#(a*b) = a*(a#b) = a

O reticulado não possui análogo na aritmética. A álgebra booleana é o reticulado mais conhecido. Exemplo de como a propriedade da absorção funciona para a álgebra de Boole:

a = a OR (a AND b) = a AND (a OR b)

Por consequência da propriedade da absorção, o reticulado também tem a propriedade da idempotência:

a AND a = a AND (a OR 0) = a
a OR a = a OR (a AND 1) = a

assumindo que "0" ou "Falso" é o elemento neutro de OR, e "1" ou "Verdadeiro" é o elemento neutro de AND.

Um reticulado distributivo satisfaz ainda a propriedade distributiva entre operações de forma bidirecional:

a#(b*c) = (a#b)*(a#c)
a*(b#c) = (a*b)#(a*c)

Novamente, não existe nada parecido com isso na aritmética. Por outro lado, a álgebra booleana é exemplo concreto de reticulado distributivo:

a OR (b AND c) = (a OR b) AND (a OR c)
a AND (b OR c) = (a AND b) OR (a AND c)

Fonte: MENEZES, Paulo Blauth. Matemática Discreta para Computação e Informática. UFRGS / Sagra Luzzatto, 2004.