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Um produto de sua época?

No artigo sobre máquinas de Turing, dei algumas pinceladas sobre complexidade de algoritmos, e mencionei especificamente a busca binária.

Ainda me lembro do primeiro contato com o algoritmo de busca binária. Foi num livro que recebi no Natal de 1988 do meu padrinho "Nilo", intitulado "COBOL para Micros". Acho que foi meu primeiro momento "a-ha!", quando se descobre um método tão mais eficiente, quase mágico, de realizar uma tarefa.

Figura 1: Capa do livro `COBOL para Micros` de Eliana Praça

Outra fonte enorme de inspiração foram os livros de Herbert Schildt, em particular o "Turbo Pascal Avançado".

Figura 2: Capa do livro `Turbo Pascal Avançado` de Herbert Schildt

Os livros desta série foram muito populares no Brasil, primeiro porque a editora dignou-se a traduzi-los, segundo porque o Turbo Pascal era bem difundido por aqui. Aliás, os produtos da Borland vendiam mais fora dos EUA que dentro.

Um grande mérito deste livro era abordar assuntos muito além do produto Turbo Pascal e da linguagem. O texto fala de algoritmos de ordenação, estruturas de dados, heap, criptografia, estatística, geração de números aleatórios... praticamente um vade-mécum, fiel companheiro do leitor por muitos quilômetros além do Hello World.

Numa época pré-Internet, num país fechado e atrasado, foi uma fonte preciosa de informação, pelo menos para quem não era acadêmico.

Figura 3: Índice do livro `Turbo Pascal Avançado` de Herbert Schildt

Outro livro famoso do mesmo autor era o "C Completo e Total". Eu tinha um exemplar, era um clássico, embora nem a linguagem nem o conteúdo me agradassem tanto. Tenho uma vaga lembrança de encontrar vários errinhos no texto. Pelo menos a edição que eu tinha dava a sensação ter sido escrita às pressas.

Figura 4: Capa do livro `C Completo e Total` de Herber Schildt

Não sei se já não teria despachado esses livros em alguma "purga" periódica que tenho de fazer para liberar espaço na estante — o sonho de uma biblioteca com milhares de volumes foi abandonado na primeira mudança que tive de pagar do bolso.

Mas esses livros eu perdi de um jeito diferente: dois "amigos" me pediram emprestado. Um queria aprender C, outro queria aprender Pascal. Emprestei, mas avisei que tinham valor sentimental e ia querer de volta. Pois bem, quando pedi de volta, falaram que já tinham passado pra frente ou jogado fora. Mal sabem que eu nunca esqueço uma ofensa...

Voltando ao Herbert Schildt. Ele tem a fama de escrever de forma imprecisa e/ou incorreta. Ainda assim, guardo muito boas lembranças do estilo informal, quase coloquial do texto. Ele privilegia acima de tudo a transmissão de conhecimento para um público leigo, mesmo que isso custe sacrificar o rigor científico. (Também é importante ressaltar que estes males acometem quase todo livro no estilo vade-mécum, não importa o assunto.)

De vez em quando, também me acusam de escrever de forma imprecisa, com pouco rigor científico, misturando fatos e opiniões, misturando assuntos díspares, e sem citar fontes. Exemplo de comentário recebido:

Figura 5: Comentário recebido a respeito de resenha escrita por mim sobre o livro `A Ditadura Acabada` de Elio Gaspari

Sim, eu escrevo "do topo da cabeça" mesmo, o site é meu e lê quem quer. Ninguém me paga para escrever e portanto não preciso seguir nenhuma forma. Se estou escrevendo sobre um tema é porque estou empolgado com ele; minha abordagem é a mesma de uma criança deixada à solta numa loja de doces.

(E sim, na hora de avaliar o mérito daquele comentário, pesou contra ter vindo de um barbudinho comunista que fez questão de usar linguagem pedante, não-construtiva e MAIÚSCULAS, tudo numa mesma frase.)

Mas fico imaginando se o meu estilo foi irremediavelmente influenciado, e mesmo danificado, pelo Herbert Schildt... A linguagem Pascal passou, mas continuo sendo um produto da minha época.

A quem interessar possa: diferente do 5A, não sou mais fã de Pascal faz tempo. Trabalhei com Delphi nos anos 1990, mas o envolvimento com software livre me expôs a linguagens muito melhores para programar no "andar de cima". E, feliz ou infelizmente, C/C++ domina o "andar de baixo" (resta uma ínfima esperança que o Rust morda um pedaço desse monopólio).

Trivia: além de programador e autor de livros consagrado, Herbert Schildt foi tecladista da banda de rock progressivo Starcastle. É portanto o protótipo do "programador rock star". Coincidência ou não, também gosto de rock progressivo.