Este texto remixa algumas informações de páginas antigas sobre impedância e harmônicos, então não é exatamente inédito, mas foca no aspecto prático do fator de potência.
Fator de potência (FP) é uma medida de eficiência, com valor absoluto entre 0 e 1. Quanto maior o FP, mais potência pode ser transmitida por uma instalação elétrica.
Ou, dada uma certa potência de carga, quanto melhor o FP, mais barata a instalação. Tudo é, em última análise, um problema de grana.
Na escola ou em elétrica básica aprendemos que "Potência = Tensão × Corrente" (P=E.I) mas isto não é sempre verdade, nem mesmo em corrente contínua.
Suponha um circuito A com tensão de 220V e corrente constante de 2A. A potência real é de 440W. Até aqui, tudo bem.
Agora, suponha outro circuito B com tensão de 220V e 20A, mas com um dispositivo de chaveamento que só permita a passagem de corrente por 10% do tempo. Se ficasse ligado 100% do tempo, a potência real seria de 4.400W. Mas, como só funciona 10% do tempo, a potência real também é 10% de 4.400W = 440W.
Agora, a pergunta é a seguinte: a bitola da fiação para os dois circuitos pode ser a mesma? Se não, qual dos dois aceita bitola menor e mais barata?
Também aprendemos na escola que P=I2R, e por conseqüência, o aquecimento da fiação é proporcional ao quadrado da corrente. Isto significa que, nos momentos em que está ativo, o circuito B aquece a fiação 100x mais que o o circuito A.
Mas o circuito B funciona apenas 10% do tempo, então na verdade a fiação aquece "apenas" 10x mais (10% de 100).
Ou seja, o circuito B é muito mais exigente com a instalação elétrica que o circuito A, apesar de ambos produzirem exatamente a mesma potência real (440W).
Mas quanto mais exigente ele é, exatamente?
O circuito A é "perfeito", portanto seu fator de potência é 1.0. O circuito B tem um fator de potência menor que 1.0. Será que é igual a 0,1? Vamos ver.
Usando a fórmula P=I2R para considerar o aquecimento da fiação. Não sabemos os valores absolutos de P ou R, então vamos considerar as proporções entre as variáveis. Se o aquecimento do fio P é 10x maior, e R é constante, isto significa que o acréscimo da "corrente aparente" I tem de ser igual à √10x = 3.16x para balancear a equação.
O circuito B possui, portanto, uma corrente aparente de 3.16 × 2A = 6,3A; e uma potência aparente de 220 × 6,3 = 1390W. Isto signfica que, apesar de produzir apenas 440W, o circuito B exige uma instalação mais robusta, capaz de forcecer até 6,3A, que uma carga bem-comportada conseguiria converter em 1390W.
O fator de potência é a razão entre potência real e potência aparente. No caso do circuito B, 440/1390 = 0.316, bastante baixo. (Mas não é igual a 0,1.)
A fiação da instalação, bem como transformadores, indutores, etc. têm de ser escolhidos com base na corrente aparente. No caso do circuito B, se soubéssemos apenas a potência real (440W) e o fator de potência (0.316) precisamos dividir um pelo outro (440/0.316) para encontrar a potência aparente (1390VA) e a corrente aparente (1390VA/220V = 6,31A).
Outro caminho seria calcular primeiro a corrente eficaz, ou seja, aquela que realmente produz trabalho. No caso, 440/220 = 2A. E então dividir pelo fator de potência para obter a corrente aparente (2A/0.316 = 6,3A).
Note que em nenhum momento dissemos que os circuitos A e B são alimentados por corrente contínua ou corrente alternada. O fator de potência é um problema para ambas, embora seja muito mais comum em circuitos de corrente alternada.
"Mas por que alguém usaria o circuito B, se poderia usar o circuito A?" Porque o circuito B permite variar mais facilmente a potência do circuito variando a porcentagem de tempo ativo, então ele é mais versátil que o circuito A, e pode ser desejável mesmo exigindo fios mais grossos.
Essa versatilidade é uma das vantagens do chuveiro eletrônico.
No tempo da onça, os chuveiros tinham uma chave verão/inverno que direcionava a corrente para duas resistências diferentes.
Suponha um chuveiro desses que consuma 18A na posição "verão" e 36A na posição "inverno". Um morador do litoral do Nordeste talvez nunca tire o chuveiro da posição "verão", então poderia dimensionar o circuito para apenas 18A (fio de 2.5mm).
Já um chuveiro eletrônico varia a potência usando um circuito "chopper", ligando e desligando muitas vezes por segundo, conduzindo a corrente de potência máxima por uma fração variável de tempo. Na posição "verão", a versão eletrônica do chuveiro mencionado acima consumiria 36A durante 50% do tempo, e zero nos outros 50%.
A pergunta agora é: a fiação de 2.5mm é suficiente para um chuveiro eletrônico que fique sempre no verão? Infelizmente não, porque o fator de potência será menor que 1.0 neste caso. Mas também não é necessário subir a fiação para 6mm, porque mesmo a potência aparente não vai chegar no mesmo patamar da posição "inverno".
Reutilizando o raciocínio do exemplo anterior. Se o aquecimento da fiação é ditado por P=I2R, e P foi reduzido à metade em relação à potência da posição "inverno", a corrente aparente I altera-se pelo fator 0,707 (√0,5). Portanto, a corrente aparente do chuveiro eletrônico no verão é de 36 × 0,707 = 25.5A. A fiação teria de ser de 4mm, pois 2.5mm só vai até 21A.
O fator de potência desse chuveiro na posição "verão" é de 0,707 (25.5A / 36A). Supondo que seja um chuveiro 220V, ele teria potência real de 3960W na posição "verão", mas sua potência aparente é de 5610VA.
Já na posição "inverno", mesmo sendo eletrônico, esse chuveiro conduz corrente 100% do tempo, neste caso a potência real é igual à potência aparente (7920W) e seu fator de potência torna-se unitário.
(Na prática, um eletricista nunca aceitaria instalar esse chuveiro com fiação menor que 6mm, pois sempre existe a possibilidade de alguém querer um banho realmente quente, mesmo em região de clima tropical.)
A seguir, vamos analisar a ficha técnica de três lâmpadas LED. São cargas muito leves, em geral não nos preocupamos com o fator de potência delas, mas o raciocínio vale para qualquer outra.
A potência da lâmpada é 4W, então a corrente eficaz em 240V é de 4/240 = 16mA. Mas o fabricante informa uma corrente de 42mA, então certamente esta é a corrente aparente, que devemos usar para dimensionar a fiação.
O fator de potência em 240V seria eria 16/42 = 0,38, pior que o >0,50 prometido pelo fabricante, mas ainda na mesma ordem de grandeza e não incomum para esse tipo de carga.
Note que a corrente aparente muda pouco de 100V para 240V. Se você refizer as contas, verá que o fator de potência é muito melhor para 100V (0,76) que para 240V (0,38). Isso é típico de aparelhos bivolt: para lidar com a tensão maior, ele absorve energia em intervalos mais curtos, o que prejudica o fator de potência.
Próximo espécime:
Segundo o fabricante, a corrente em 220V é 136mA. Seria esta a corrente aparente ou a eficaz? Uma conta rápida mostra que 220 × 0,136 = 29,92, quase igual à potência de 30W alegada, então esta é a corrente eficaz, que não nos serve para dimensionar fiação.
A corrente aparente seria 0,136/0,60 = 226mA. Veja que, para este fabricante, "corrente nominal" significa corrente eficaz, enquanto para o anterior, significava corrente aparente. Ou seja, a nomenclatura não é uniforme e não se pode confiar nela.
Um circuito de iluminação típico, com fiação de 1,5mm e 14A, poderia alimentar aproximadamente 60 spots desses em 220V. Fazendo esse cálculo pela corrente eficaz, sem levar em conta o fator de potência, chegaríamos a 100 spots, que sobrecarregariam a fiação.
Em ambientes grandes, não é incomum ligar dezenas ou centenas de spots desse tipo num mesmo circuito, então mesmo sendo uma carga de baixo consumo individual, o fator de potência não pode ser negligenciado.
No caso de cargas de alto consumo ou muito numerosas, não é exagero medir nós mesmos a corrente aparente para conferir se a ficha técnica está falando a verdade. Um alicate amperímetro custa menos que um hamburguer gourmet hoje em dia.
Mais um exemplo:
Novamente, o que o fabricante chamou de "corrente nominal" é a corrente eficaz: 9mA = 2/220 = 0,009.
Outro sintoma de que as correntes da ficha técnica são as eficazes, é que elas são inversamente proporcionais à tensão. Porém, lâmpadas LED bivolt costumam apresentar uma corrente aparente parecida para 127V e 220V, pois seu fator de potência piora conforme sobe a tensão.
A julgar pelo fator de potência alegado pelo fabricante (0,5) a corrente aparente em 220V deve ser o dobro: 18mA.
Um baixo fator de potência aumenta os custos de transmissão e distribuição de energia elétrica. Porém, assim como o trabalho entregue pelo aparelho depende apenas da potência real, o custo de geração da energia (combustível, água da represa) também depende apenas da potência real das cargas.
Portanto, a priori, a conta de luz cobra apenas pela potência real, não pela potência aparente. Pelo menos no que tange à fração da conta relativa à geração.
Em consumidores residenciais, a companhia elétrica (ainda) não monitora o fator de potência de cada casa, embora os medidores eletrônicos já caguetem esse número, então pode até ser que já estejam acompanhando. Por outro lado, grandes consumidores são monitorados e taxados se tiverem baixo fator de potência, para compensar os custos maiores de transmissão.
Conforme vimos, em corrente contínua, uma carga com fator de potência unitário absorve corrente de forma também contínua, não pulsante. Mas, em corrente alternada, a tensão muda o tempo todo, então a corrente também muda o tempo todo, de algum modo. Pode uma carga ter um bom fator de potência nessas condições?
A resposta é sim. Uma carga linear é aquela cuja corrente é sempre proporcional à tensão. Tal carga possui fator de potência unitário mesmo em corrente alternada — noves fora a questão da defasagem entre corrente e tensão observável em cargas reativas, que abordaremos depois.
Em geral, aparelhos elétricos simples (transformadores, motores, torradeiras, chaleiras elétricas, chuveiros não-eletrônicos) são lineares. Cargas com consumo pulsante, como lâmpadas de LED, aparelhos eletrônicos em geral, chuveiros eletrônicos, etc. são não-lineares.
Uma carga resistiva é aquela que tem comportamento semelhante a uma resistência: toda a energia elétrica absorvida é convertida de forma irreversível em trabalho. Aquecedores em geral são exemplos "perfeitos".
Já uma carga reativa pode armazenar energia e devolvê-la em seguida para a rede. Isto diminui seu fator de potência, conforme veremos mais adiante. Cargas indutivas como motores e transformadores são exemplos típicos.
Uma carga pode ser linear e reativa ao mesmo tempo (caso de motores e transformadores). Uma carga não-linear pode ser resistiva ou reativa. A maioria dos aparelhos modernos é um pouco de tudo, por exemplo uma máquina de lavar louças, que aquece a água (linear e resistiva), possui uma bomba de água (linear e reativa) e um circuito eletrônico de controle (não-linear).
No fundo, essa questão do fator de potência só existe porque insistimos em usar as fórmulas simplistas da lei de Ohm. Nesse mundo ideal, tensão e corrente podem ser expressos por um simples número, e as cargas têm resistência constante e são lineares. Mas, na vida real, a corrente pode ser pulsante e/ou alternada, e pode assumir inúmeras formas de onda.
Conceitos como corrente eficaz, corrente aparente, potência aparente, fator de potência, etc. são métodos para lidar com a complexidade da vida real.
Um aparelho elétrico possui no mínimo "dois" números de corrente: aparente e eficaz — através dos quais podemos determinar as potências aparente e eficaz, ou vice-versa.
Com esses dois números, temos informação sufciente para instalar e operar o aparelho. O valor eficaz nos diz o trabalho produzido; o valor aparente determina a bitola do fio, entre outras coisas.
Mas como o fabricante determina a corrente aparente? Através da média quadrática ou RMS (Root Mean Square). Para fazer a média RMS, é preciso conhecer a forma de onda da corrente.
Vamos relembrar o "circuito B" lá do primeiro exemplo. Ele consome 20A de forma pulsante, por 10% do tempo. Se dividirmos o tempo em 10 fatias, apenas 1 fatia com corrente de 20A, as demais zero, a média quadrática é
√((20×20 + 0 + 0 + 0 + 0 + 0 + 0 + 0 + 0 + 0) / 10)
= √(400 / 10)
= √(40)
= 6,3A
que é exatamente o valor que tínhamos encontrado antes, usando a fórmula P=I2R como argumento.
A corrente RMS, que temos chamado até aqui de corrente aparente, é útil porque ela mensura corretamente o estresse sofrido pela instalação elétrica, que é em geral proporcional ao quadrado da corrente.
Por outro lado, para saber quanto uma carga vai custar na conta de luz, é a corrente eficaz que importa. Numa carga linear e resistiva, corrente eficaz e RMS são iguais.
Em corrente alternada, quase sempre usamos os valores RMS de corrente e tensão. Uma rede de "220V" chega a picos de 311V. A média RMS da onda senoidal é que é 220V. (A média aritmética é de 195V.) Utilizar a média RMS permite fingir que estamos usando corrente contínua, e aplicarmos impunemente a lei de Ohm.
Se passarmos uma corrente contínua de 220V por uma torradeira, ela terá o mesmo desempenho que em 220V RMS corrente alternada. O valor RMS da corrente também será igual nos dois casos. Isso porque a torradeira é uma carga puramente resistiva e linear. Qualquer coisa mais complexa talvez nem funcione se alimentado com corrente contínua.
A corrente informada pelo fabricante deveria ser sempre a corrente RMS, pois ela será usada para dimensionar a instalação. Aparelhos de medida de corrente como multímetros e sensores são quase todos programados para calcular e informar a corrente RMS.
Por outro lado, se você precisa determinar a potência eficaz, precisará de um wattímetro. Um simples medidor de corrente não é suficiente se a carga não for resistiva e linear.
Como dissemos antes, o fator de potência emerge do fato da corrente não poder ser descrita por um simples número; ela possui uma forma de onda. Conforme essa onda desvia do ideal, surge uma diferença entre a corrente RMS e a corrente eficaz.
Um dos desvios possíveis é a distorção harmônica, ou fator distorcional. É o que já temos exibido em diversos exemplos: uma carga absorve corrente em pulsos em vez de continuamente. Costuma ser mais discutido no âmbito da corrente alternada, mas nada impede que aconteça em corrente contínua.
Este é o principal problema nas instalações elétricas residenciais de hoje em dia. Além de reduzir o fator de potência, os harmônicos causam diversos outros dissabores que não podem ser resolvidos por um simples incremento da bitola da fiação.
Vimos antes que luminárias LED têm fator de potência em torno de 0,5, que já é bem ruim. Existem cargas ainda piores. Aparelhos em standby podem chegar a 0,25. Sim, eles consomem pouco, mas imagine quantos bilhões de aparelhos em standby existem por aí. Achei um eletrodoméstico aqui com fator de potência de 0,14!
Este era um problema irrelevante até há pouco tempo, e "explodiu" com a adoção em massa de iluminação LED e aparelhos eletrônicos de potência como chuveiros eletrônicos, computadores e eletrodomésticos inverter. Aparelhos mais potentes já tendem a possuir circuitos PFC para corrigir o fator de potência, e a tendência é que as agências reguladoras exijam essa correção em todos os dispositivos, mesmo os de baixo consumo individual.
Dispositivos analógicos e em princípio lineares como transformadores também podem perder a linearidade e passar a absorver corrente de forma pulsante, se sobrecarregados ou de má qualidade.
Este é o fator de potência "clássico", o único de que se falava até há pouco tempo. Motores de indução e transformadores são os exemplos mais comuns de cargas lineares reativas, que apresentam este tipo de fator de potência. Este é um fenômeno exclusivo de corrente alternada.
Por ser o tipo mais antigo, existem inúmeros textos que explicam muito bem o fator de potência de deslocamento, e não vou tentar refazer o esforço aqui. A explicação curta é a seguinte: cargas reativas (indutivas e capacitivas) podem armazenar energia e devolvê-la à rede em seguida. Uma carga reativa realmente funciona como gerador de energia elétrica — por uma fração do tempo.
Por conta disso, a energia fica indo e voltando, criando uma "corrente falsa" que não produz trabalho. Mas, apesar de "falsa", a corrente existe e a instalação precisa ser dimensionada para suportá-la. A proporção entre corrente eficaz (que produz trabalho) e corrente total é o fator de potência de deslocamento.
O exemplo mais gritante é o motor de indução. Um motor de 1HP vai circular quase a mesma corrente, esteja trabalhando em vazio ou a plena carga. Muda apenas o fator de potência, que melhora conforme o motor trabalha mais. Então, o consumo de energia no relógio será proporcional ao trabalho realizado, mas a instalação sofre o mesmo estresse independente da carga mecânica.
Por conta disso, não é recomendável usar um motor superdimensionado, por exemplo um motor de 5HP para uma carga de 1HP, porque a instalação teria de suportar a corrente de 5HP a plena carga (que aliás ultrapassa a capacidade de uma rede residencial típica), mesmo que o trabalho realizado nunca seja superior a 1HP.
Algo semelhante acontece com transformadores trabalhando em vazio. A corrente de magnetização continua circulando, mas com fator de potência zero, pois nenhum trabalho útil está sendo realizado, então não é negócio usar um transformador excessivamente superdimensionado.
O fator de potência de deslocamento é mais "benigno" que o outro, pois a) não introduz outros problemas que não o aumento da potência aparente, e b) é mais facilmente corrigido pois o deslocamento introduzido por um indutor pode ser "cancelado" por um capacitor e vice-versa.
Um mesmo dispositivo pode apresentar os dois defeitos: fator de potência distorcional e de deslocamento. Se um é 0,9 e o outro é 0,7, multiplicamos os números para obter o fator de potência total, no caso 0,63.
O fator de potência distorcional é um índice apropriado para dimensionar a fiação, mas ele não captura totalmente a "ruindade" de uma carga pulsante. Vide o exemplo a seguir:
O fator de potência do dispositivo acima é 0,5. Mas veja que a corrente (linha vermelha) possui picos de mais de 4A, quase dez vezes a corrente média.
Para medir esta distorção de forma mais realista, temos o fator de crista, a razão entre a média e o pico. No exemplo acima, o índice é de quase 10. Isto é sete vezes maior que o fator de crista de uma carga linear em corrente alternada (1,4).
Embora o fator de crista não seja relevante para e.g. dimensionar bitola de fiação, a distorção harmônica causa muitos outros problemas, e o fator de crista dá uma ideia melhor de quão graves eles serão.
Não é possível derivar diretamente o fator de crista a partir do fator de potência ou vice-versa, porque são apenas índices, que "escondem" a real forma de onda.
Outro índice que expressa (de forma mais matematicamente rigorosa) a distorção harmônica é o THD. Considerando que a onda senoidal é a ideal, o THD mede o quanto a forma de onda desvia desse ideal. Obviamente, uma carga linear possui THD=0%.
Se o fator de potência de um aparelho for puramente distorcional, é possível converter fator de potência para THD e vice-versa. No exemplo acima, o fator de potência de 0,5 equivale a um THD de 173% (sim, acima de 100%, horrível mesmo).
Em algumas situações, pode ser útil calcular a chamada "potência reativa" (R), que é a potência aparente (A) descontada da potência eficaz (F). Porém esse desconto não se faz através de uma simples subtração. A relação entre as três segue a fórmula de Pitágoras e costuma ser ilustrada por um triângulo:
A2 = F2 + R2
A mesma relação vale para as correntes RMS (ou "aparente"), eficaz e reativa. O ângulo φ tem importância especial, pois a abertura do mesmo define a potência reativa, e o valor de cos(φ) é igual ao fator de potência.
Se o fator de potência for puramente de deslocamento, o ângulo φ corresponde ao defasamento entre tensão e corrente. Por outro lado, se o fator de potência for distorcional, φ não tem um significado concreto.
Esta relação implica que, por exemplo, uma carga com corrente RMS de 10A e fator de potência 0,7 apresenta corrente eficaz de 7A e corrente reativa de 7A (pois φ=45º, cos(45º)=0,707).
Isto pode parecer estranho: como pode que a "soma" de 7+7 é igual a 10?! A questão é que a corrente de 10A não existe, ela é uma média RMS, portanto teríamos de fazer a soma RMS desses valores. Verbi gratia, a soma RMS de 7,07 com 7,07 é igual a 10: √(7,072+7,072) = √(50+50) = √100 = 10.
Outra forma de ver a coisa é que nem toda a corrente eficaz vem diretamente da fonte. Parte dela será corrente reativa "reciclada" que alimenta a parte resistiva da carga em vez de retornar à fonte.
Os mais inclinados à matemática podem visitar nosso textão sobre impedância, onde o conceito de impedância complexa é devidamente abordado.
Vimos que existem dois "sabores" de fator de potência. O que chamamos, talvez impropriamente, de "potência reativa" (R) no tópico anterior é por sua vez a soma RMS da potência de deslocamento (D) e da potência distorcional (H). Novamente, Pitágoras estabelece a relação:
R2 = D2 + H2
Podemos combinar as duas fórmulas, obtendo A2 = F2 + D2 + H2
A representação gráfica dessa igualdade é um paralelepípedo, onde F, D e H são os lados, R é a diagonal de uma face, e A é a diagonal do paralelepípedo.
Até agora, falamos que o fator de potência pode ficar entre 0.0 e 1.0. Mas ele também pode ser negativo, até -1.0. Um fator de potência negativo significa que a potência está sendo transferida de forma permanente do dispositivo para a rede. É o caso de um gerador.
Assim como acontece com uma carga, um gerador também pode ter fator de potência fracionário. As implicações são as mesmas do fator de potência fracionário positivo. Entre outras coisas, implica que a fiação necessária para conectar o gerador à rede tem de ter bitola maior do que a calculada com base na potência eficaz gerada.
Um tipo de "gerador" relativamente comum, que muita gente tem em casa, é o no-break. A potência dos no-breaks costuma ser especificada em VA e W. Por exemplo, um no-break de onda quadrada típico possui potência aparente de 1200VA, potência eficaz de 600W, e obviamente fator de potência 0,5. O que isto significa?
Primeiro, que os fabricantes são safadinhos e costumam anunciar a potência aparente com mais ênfase, porque é o número maior — quando o número que mais importa é a potência eficaz pois essa é a medida da capacidade de conversão de energia, da bateria até o equipamento alimentado.
Mas a potência aparente também é importante, porque o no-break tem de ser capaz de suprir tanto a potência eficaz quanto a potência aparente do equipamento alimentado. Se o no-break do exemplo acima tivesse fator de potência unitário, e a carga tivesse 900VA de potência aparente, o no-break não daria conta.
Uma vez que equipamentos de informática costumam ter fator de potência baixo, é apropriado que o no-break também seja assim — muito embora no-breaks com saída de onda quadrada ou mesmo "semi-senoidal" tenham outras desvantagens.
Determination of Power Factor and Harmonic Distortion of AC/DC LED Driver. Laboratory of Applications of Plasma, Electrostatics and Electromagnetic Compatibility (APELEC) Djillali Liabes University of Sidi Bel-Abbès, Algeria